Artigo nº 975 - 18/11/2022
Levar antas
Segundo Amyr Klink, os professores da engenharia naval devem conhecer melhor as jangadas e canoas dos caiçaras das costas brasileiras para projetar navios para até 17.000 containers, rebocadores para petroleiros de 400 metros, ferry-boats para 1.200 automóveis e por aí vai.
"Devemos levar antas que dão aula na USP para aprender o saber tradicional, diz Klink".
Ele como formado em administração de empresas torna-se autoridade em construção naval. Fico pensando a razão não ter se aventurado com uma jangada de feixes de embaúba para a Antártida...
Século 21, o século dos insultos.
Entretanto isso é comum na área da engenharia, onde todos não-engenheiros ou leigos se arrogam melhores conhecimentos, práticas e feitos.
Quase um ódio coletivo de técnicos, mecânicos, mestres e demais contra o idiota que foi por alguns anos à faculdade e com alguns cálculos projeta algo usando do embasamento téorico.
Não sabe de nada, quem entende é o Zézinho da Mecânica Nossa Senhora de Fátima, a trocar rebimbelas e pirombetas para a madame.
Enfim, nada contra antas, nunca entendi porque se tornou termo pejorativo. São animais dóceis e tranquilos.
Ou talvez por isso.
Pois espero uma das "antas" da USP solicite Amyr procurar caiçaras o ajudem em seus projetos, sem uso de desenhos, calculadoras, regras de Simpson e por aí vai.
Quiçá os leve à Coréia para ensinar melhor às antas de lá como fabricar navios para 17.000 containers.
Baideuei, Amyr, as jangadas hoje são construídas quase que exclusivamente para turistas, com compensado naval, preenchidas com isopor (uma invenção de engenheiros químicos), alguns já se arrogam velas de tecidos sintéticos e um ou outro tem discreto GPS de bolso, só para um momento mais delicado na navegação.
Por bom motivo até, a madeira para jangadas, por descoberta de algum imbecil engenheiro ambiental, foi limitado e proibido seu corte pelo governo do Ceará; estava praticamente extinto o vegetal. Pois as jangadas do modo antigo duravam muito pouco, a reconstrução era quase anual.
Amyr Klink em Parati, na FLIP, 2019. Foto de Mathilde Missioneiro, Folha Press.