Hermó

Espaço de reflexão Hermógenes de Castro & Mello

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Artigo nº - 21/08/2023

O gentil homem.

Classifico como algo falso do passado, incompreensão de quem nos observava e assim rotulava.

Podemos ser simpáticos de tempos em tempos, porém raramente gentis de fato. E nesse século XXI, até creio por influência global e a liberdade nas redes, não se vislumbra algo melhor. A gentileza passou à raridade, quase ente secreto apenas alguns ainda ousam apresentar.

Somos brutalmente francos e pouco gentis.

Gesto marcante para mim, acompanhando excepcional e autêntico homem gentil conheci, era nas idas a rincões distantes passando por fazendas e suas incontáveis cancelas, a cada parada esse senhor por cortesia dar algum trocado para os meninos, que acorriam abrir. Na falta do valor adequado, alguma fruta ou biscoito carregava consigo. O sorriso era a gratificação a ele, homem apreciava as relações gentis. Sem discriminar.

Melhor, até àqueles claramente inconformados com sua cordialidade, agressivos, somente se opunha com mais bons tratos. No estilo "com grosseria não me pegam, nem provocam".

Aprendi um tantinho com ele, sem jamais alcançar o patamar, infelizmente. Sou dos gentis com seus limites.

Dias atrás, a adentrar um hotel em cidade gringa e seguir aos elevadores, acionei os botões, como é praxe. O cavalheiro de casal jovem ao lado, também à espera detonou "será que somos invisíveis e não se respeita a fila?". Não havia fila. E os demais circunstantes, constrangidos com a manifestação grosseira, assim a companheira do jovem quando viu sermos idosos e natural ceder na fila não existente, me fez lembrar o dito: para a guerra basta um olhar enviesado, para a paz milhões de mortes e diplomatas exaustos.

Abertas as portas dos elevadores fiz gesto pedindo ele seguir à frente e usufruir de sua visibilidade, apesar de um tanto envergonhado com a própria grosseria.

Os gestos de cortesia são lentamente enterrados, por alguma misteriosa orientação global. Certo regalo para acompanhar o convite, agradecer após, elogiar... enfim não é mais tão comum. Até na intimidade familiar, cessou! Rotula-se como antiquado, desnecessário e citando a mera presença do convidado já ser agrado feito. A grosseria impera, mostra determinação, modernidade e certo leve não-preciso-adular-ninguém.

Talvez a gentileza seja apenas um mito. Pois se todos fôssemos cordiais e corretos no tratamento, o planeta seria terrivelmente tedioso.

Precisamos xingar juízes de futebol, depreciar outras etnias e até matar loucamente por "nossa segurança", como diz o mago maior da falta de gentileza ou modos mínimos, o atual ditador russo. Tal como o rapaz do elevador, procura eterna visibilidade.

Enfim, somos assim, pouco gentis mesmo.

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