Automedicação !
Meu pai, faleceu aos 57, recomendava o uso de 10 comprimidos diários da tal Cibalena e 2 maços de Luiz XV, com média de 15 - 20 cafezinhos. Dizia das ist die einzig wahre Medizin. ( Trad. : Essa é a única verdadeira medicação).
Almoço dele de preferência ser um pastel-pizza, do chinês O Marinheiro na Rua Alfredo Pujol. À noite, o jantar eram cigarros, com Jornal Nacional.
Já falecido grande amigo se medicava com scotch (segundo seu desolado pai, 1 garrafa até 1/2 dia, à tarde só cervejas...) e sanduíches de padaria, onde sempre conseguia provocar alguém. Com as marcas no rosto, das porradas, ligava marcando novos almoços conosco. Mas nos últimos 3 anos não conseguiu mais aparecer... os medicamentos eram fortes demais.
Meu primo, que Manitou o tenha sob seu tótem, acordava e ia invariavelmente ao Frühschoppen em Braunschweig, comum somente aos domingos. Mas o cara do boteco liberava para ele todos os dias... Até seguir ao trabalho, (tinha uma empresa boa, com quase 500 funcionários, terceirizava limpeza para redes como Hertie e Karstadt naquela região), já tinha se medicado na razão de 4 - 5 litros de Feldschlösschen Pils. Morreu aos 55 anos, enfartado e semi-afogado com a cabeça dentro do vaso sanitário.
Certo outro primo, de mesmo prenome (nome bem popular na família...), se medicava com álcool de farmácia 95%, que injetava com um klister, (aquela bisnaga de lavagem intestinal), para não denunciar-se pelo bafo e não perder o emprego como supervisor numa fábrica de motores de navios em Halberstadt, Saxonia. Era conhecido como o mais bem humorado colega e que "bebia pouco". Foi encontrado caído no fundo de vagão de bonde, 46 anos, morto e todo amarelo, o fígado não agüentou o injetável remédio.
E recordo também de Heinrich, primo do meu pai, de Hattorf próximo a Wolfsburg, em 1963 me levou, eu com 6 anos, ao Schützenfest (Festa de Atiradores) do vilarejo, deixando-me provar cerveja. E voltei caminhando sozinho. Minha tia-avó perguntou se ele tinha tomado "remédio demais" para eu voltar só, e confirmei estar dormindo no parquinho, em frente ao Gasthof Der Schütze, um boteco, às 10 da manhã...
Já Frau M. não se medicava. Secretária do pai, apareceu com câncer de estômago. Foi operada, não deu muito certo, o troço progrediu. Deram a ela água de cacto, vindo do México, a preço de ouro, não resolveu. Adiante a filha, Nanni, a conveceu tomar um suco de gafanhoto moído, durante meses. Sem efeito. Por fim levaram a senhora para Congonhas do Campo, numa viagem de Rural Willys em um colchão no fundo da perua. Lá foi encaminhada ao lendário Dr. Fritz, alterego de José ou Zé Arigó.
Esse não sabia ela era alemã, e "baixado o santo" a operar, começou a falar em seu alemão autoral, digamos. Na verdade não era bem a língua de Goethe. A coitada riu, dizem ela ria com vontade de morrer ali, de tão intensa frustração sentiu com aquela bobagem inventada pelo mineiro sabidão.
Mas pagaram o Arigó e voltaram a Sumpa, morreu logo em seguida. O curandeiro de meia pataca ainda lhe vendeu umas pílulas de farinha, para resolver a "indisposição". Os familiares ficaram bronqueados. Seguranças os afastaram...
Já minha avó E., morta aos 94, dizia sempre : tem que acreditar, das ist der Plazebo-Effekt ! (Trad.: Tem que acreditar, esse é o efeito placebo!) E é isso mesmo, temos que acreditar. Somos assim.