Dário, o misantropo.
Por Odorico Leal, de Picos, PI
Como todo misantropo, Dário também era egocêntrico. Não bastava odiar, queria também ser odiado. Depois de alguns anos de Internet, Facebook e memes, o país tinha se dividido.
A situação o animava. Para os liberais, dizia que faltava governo no Brasil.
Aos conservadores, dizia Deus existe, mas é um depravado. Para os comunistas, rosnava: “Comunistas!”. Tudo lhe dava satisfação.
Mas sempre que atacava um grupo, era momentaneamente admirado por outro. Ele entendia a psicologia da mente ideológica, e isso o exasperava; o sujeito de uma ideologia podia amá-lo e odiá-lo ao mesmo tempo, contanto que não deixasse de agredir a ideologia contrária.
E Dário não resistia: precisava ofender todos, e assim era também admirado por todos. Não podendo suportar a ambiguidade desse afeto, maquinava uma ofensa polideológica que ferisse suscetibilidades por todo o espectro de crenças e esperanças.
Refletiu, ponderou, corrigiu-se, até que chegou à postagem mortal. Foi lá e escreveu:
“Se você tem cachorro e gato, favor não se referir a eles como filhos. Você pode jogar comida numa tigela, sair de casa e voltar dez horas depois, e o gato e o cachorro estarão lá, tão gato e cachorro quanto antes. Então meça suas ideias: evite apropriação.”
Dário teve a página bloqueada. Tentava reabri-la, mas não conseguia. Tinha sido banido. Foi pra rua e ofendia as pessoas na cara delas. Apanhou e amofinou-se. Ficava no apartamento, em Copacabana, gritando impropérios da janela.