Primaveras
Por Erica Teixeira, de Salvador
A minha primeira grande crise existencial sucedeu-se ao completar 20 anos. Acreditei verdadeiramente que a mudança da cifra me imputaria responsabilidades por demais onerosas.
Mal sabia o que me esperava.
1/4 de século, em termos numéricos, é muito pouca coisa. Acontece que as primeiras marcas e cicatrizes de nossas vidas não teriam outro lugar que não aqui. Primeiros passos, primeira escola, primeiros amigos, primeiro beijo, primeiro porre, primeiro adeus, vida universitária ... quem, em sã consciência, iria desmerecer o valor de ser jovem ? Ou melhor, quem é cabra macho o suficiente para assumir que jamais conseguirá suportar uma semana inteira acordado - e já velho - com cana e café por conta do acúmulo das responsabilidades não cumpridas ?
São tantas memórias que nos perguntamos se aguentaremos mais 25 anos na intensidade das primaveras já vividas. Também me questiono se mais alguém compartilha dessa sensação .. mas no fundo, nos sentimos já um pouco velhos e sabedores-de-quase-todas-as-coisas. Quanta ingenuidade e prepotência a nossa.
Completar 25 anos é quase a mesma coisa que andar no limbo. Se de um lado a juventude é uma realidade não tão distante distante, de outro, a vida adulta, todos os dias, bate à nossa porta para lembrar que liberdade e responsabilidade coexistem na mesma balança. Uma sem a outra adoece o corpo e enlouquece a alma. Ao mesmo tempo, atingir essa idade é a forma mais fantástica de nos mostrar que mesmo já completamente donos de nossas faculdades mentais, a juventude ainda sopra os ventos que nos ajudam a navegar.
Aqui, encerramos o ciclo da juventude do corpo, jamais o do espírito.
Do pouco que sei, muito me inspira ver tantas e tantas manifestações humanas sobre como é prazeroso chegar aos 30, 40, 60 e por aí vai ... mal sabem que gostoso mesmo é refletir sobre a certeza de que essas decádas que estão por vir dependem de toda e cada escolha que estamos fazendo agora, nesse exato momento.
Ainda temos muito o que errar. A euforia de viver, crescer, ter prazer e aprender é muito grande. Mas chegar onde chegamos é espelho de nós mesmos e de, mais uma vez, cada escolha que fizemos ao longo de nossas vidas. Se certas ou erradas, ainda não há propriedade para se responder, mas certamente inesquecíveis, mágicas e inigualáveis. E juventude é isso mesmo.
Que os próximos anos, já não mais tão irresponsáveis como antes, sejam de mais acertos que erros. Mas que sejam vivos. E que continuem sendo exatamente como foram: únicos e intensos. Não temos o direito de desejar nada além disso. Aliás, pedimos que vocês, cujos muitos anos a nossa frente deixam claro que maturidade é um excelente somatório de experiência + tempo, tenham também um pouco de paciência. Estamos aprendendo e queremos sempre melhorar. Mas a nossa geração é outra e nossas demandas também.
Que possamos comemorar mais outros 3/4 de século nos lembrando, todos os dias, que como já dizia um velho sábio, felicidade é como uma festa: ninguém a faz sozinho.
Somos assim.