Experiências de aprendiz.
Por Luiza Bussius, de São Paulo
Há um tempo me peguei encucada em desvendar como é que aprendo. Sendo professora, não teve jeito. É preciso, minimamente, pensar nos processos de aprendizagem.
Pois bem, se formos pela pedagogia, nos deparamos com as vastas teorias de como isso ocorre, por que, quando, qual o tempo necessário, alguns afirmam até mesmo a idade, as cores, a disposição espacial dos móveis, o tipo de letra, a organização da lousa, as questões a serem feitas, detalhes e mais detalhes, também chamadas de metodologias, com um único e mesmo objetivo final: produzir aprendizado. Mas é engraçado, não são suficientes para desvendar esse belo mistério do aprender. Afinal, como aprendi o que sei? E de que maneira essas reflexões um pouco obsessivas sobre aprender me levam ao ensinar?
A questão tomou meu cotidiano. Pensava nos intervalos do dia, retomando minha pequena bagagem de vida, nos significativos aprendizados que tive. Significativos por que lembro o processo de aprendizado que resultaram nesse conhecimento que identifico como algo aprendido. Eita! Tá ficando repetitivo isso.
Iniciamos com a ideia repetitiva portanto. Os contemporâneos reivindicam, mas não há como negar, que aprendemos por repetição. Um exemplo? Amarras os sapatos. Ainda bem baixinha lembro de inúmeras e repetitivas tentativas de juntar aqueles laços frouxos, elaborar um nó específico, e com isso propiciar um tênis mais firme e ajustados aos pés. Tarefa complexa, para os que pela primeira vez se aventuram. Outro exemplo bastante comum: o equilíbrio no incrível veículo movido a duas rodas. Quantas voltas na casa foram necessárias para enfim conseguir soltar as perninhas do chão?
Mas a exploração do operariado nos lembra que repetir não é a única maneira de aprender. Nas tarefas práticas a repetição é fundamental, mas no exercício da lógica, facilmente podemos cair na propagação de discursos vazios e reacionários. Há mudança na vida. Aprendemos muito com ela.
A alimentação é algo essencial à nossa sobrevivência. Mas quando em situações com poucos deliverys é preciso aprender a cozinhar. Relacionados a gastronomia reúno mais dois aprendizados que lembro bem como adquiri.
Uma boa refoga leva um saboroso alho, mas sua casca extremamente fina não é fácil de retirar. Aos cuidados de meu caro pai, grande apreciador do universo da cozinha, aprendi que utilizando um cabo da faca e pressionando o alho, a casca se solta, num leve achatar do tempero. Não teve outra. Desde então, os alhos são assim descascados por mim. Aprendizado na escola? Nos livros? Na televisão? Quem sabe na rádio? Não, na própria prática compartilhada. Aprendizado útil em meu cotidiano.
Ainda relacionado ao alho. Retiramos a casca, mas ainda nos falta cortá-lo. Enfrentamos a tarefa, mas o odor de nossas mãos é invadido pelo inconfundível alho. Qual aprendizado relacionado a isso? A mesma faca, que tanto nos auxilia na manipulação dos alimentos pode mais uma vez ser utilizada. Deslizando os dedos pela lâmina em água corrente, eliminamos um pouco do cheiro impregnado aos dedos. Aprendi com uma amiga nos tempos universitários. Muitas vezes quando o faço lembro de quando e como aprendi, assim como da “professora”. Como poderíamos classificar esses aprendizados? Pela experiência compartilhada? Com o grande Outro?
Ainda não era suficiente para minhas reflexões do aprender. Afinal, existem outras maneiras de aprender? Sim. Muitas mais.
Escutar. Nas derivas pelo mundo, morei um tempo fora. E as horas e horas e mais horas de escuta das pessoas desse país me levaram a aprender uma outra língua. Escuta atenta é hábito que também leva ao aprendizado.
Ler e escrever. Nunca havia parado para pensar nisso, mas quando comecei no universo da educação, caí de paraquedas na alfabetização de adultos. Foi fatídico: como é que ensino alguém, adulto, a ler? E lá estava eu me perguntando sobre como aprendi essa capacidade tão sofisticada dos seres humanos que é a linguagem escrita. Símbolos, sons, estruturas complexas que entendo que até hoje sigo aprendendo. Uma palavra nova que nunca me deparei e lá estou, outra vez aprendendo. 15 anos pelo menos de aprendizado? Poderíamos criar aqui a categoria do tempo, como condição para aprender?
Erros. Puxa! Como aprendemos com eles. Ajustados a uma sociedade com normas e moral somos levados a crer que existe o certo e o errado. Aspecto bastante curioso, posto que tão relativo, mas enfim, a moralidade e a validação do conhecimento e da cultura nos ensina isso. Quer queira, quer não, introjetamos hábitos, pensamentos, falas, condutas. E nesse sistema surgem os erros. Essa lógica de sociedade também nos ensina. Seja pela causalidade, seja pela impressão de significado que o erro lhe mostra. Que belos aprendizados quando erramos. Dos mais diversos aos mais humilhantes e duros de aprender. Aprendemos enquanto sociedade? Enquanto cultura? Enquanto linguagem?
A consideração final é que aprendemos. Com o outro, conosco, em sociedade, no silêncio, no barulho, no real, no imaginário, no simbólico, nos livros, na sala de aula, no cinema, na viagem, na dor, na angústia, na utopia, na cidade, em casa a observar um móbile em movimento ou mesmo numa simples tarefa de ir ao banheiro fazer xixi. Imersos em aprendizados e aprendizagens seguimos. Somos assim. Ávidos e condicionados a aprender nos detalhes e nas grandes leis da física.