Alívio
Por Ana Cristina Braga Martes, de São Paulo
Garfos e facas em paralelo, bem posicionados, o jantar servido à mesa.
Ela se sentaria à minha frente, completando a cena. Havia antes descascado as batatas, uma a uma, e a lembrança: não abuse do sal, não foi uma metáfora. As cebolas, a casca fina, duas, três camadas resistindo à lâmina da faca sem lágrima alguma.
Salsa picada e os pedaços frescos de atum cozido puxaram de novo: não abuse do sal, porque ela não vai gostar, talvez ela não gostasse, mais provável que não, mas já havia terminado.
Sentei-me e, depois de um longo suspiro na cadeira que até então não tinha percebido nenhum conforto, algum tempo se passou, mas eu não sei.
Abri meus olhos que ainda ardiam, pressentindo o cheiro da cebola nas pontas dos dedos. Me perguntei se havia dormido, sentia pressa como um recém desperto.
Foi a primeira e única vez que repassei, a uma mulher, a chave de casa.
Procurei e vi. À minha frente, apenas eu e ela: a salada de batatas.