Foto do Hermógenes

Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Que idade temos ?

Por Erica Teixeira, de Salvador

Dia das Crianças é uma data que sempre me causa muito incômodo. Ainda que velha para qualquer tipo de comemoração, gosto de revirar fotos antigas de tempos em tempos. Sabe aquela sensação de que, a cada dia que passa, estamos supostamente mais distante de que originariamente éramos ?

Péssima no trato, mas curiosa no assunto, vejo nos pequenos uma mistura de encarnação do Satanás com nuances angelicais no semblante ... melhor dizendo, criança é um bicho teimoso, ousado, carecedor de cuidado e estudo. E divago ...

Voltando ao ocorrido, muito duvido que todos não tenham um espaço da casa abarrotado de álbuns hiper-mega cafonas e fotografias constrangedoras de todos aqueles momentos ridiculamente habituais registrados por nossas excelentíssimas, como se fossem eventos equiparáveis à Queda Da Bastilha.

Curiando flash a flash, me vieram aqueles pequenos curta-metragens de conduta quando inimputável. O que pensava, como agia, do que gostava, se obedecia ou se teimava em contrariar ...

No frigir dos ovos, não me adequava muito a certos critérios de “normabilidade” (na verdade, criança nenhuma se adequa ... e essa é a melhor parte).

Tive infância invejável. Era uma criança gulosa. Sem noção nos gestos e sem pudor nas perguntas. Curiosa nas pequenas coisas e sorridente mesmo quando ainda me faltavam muitos dentes. Quase morri umas 3 vezes (e não por falta de saúde ou cuidado familiar - mas por falta de bom senso mesmo).

Comia coisas não-comíveis (ração de cachorro, enfeites de natal, batom, cremes faciais, sabão em pó e areia), achei que poderia voar do segundo andar, sem contar com as vezes em que fui deixada pra trás quando desbravava a roça num pangaré revoltado ...

Sempre tive a sensação de que crianças representam um estado absoluto de ser, de fazer, de querer, de desejar, de estar e de criar. Respeito muito suas opiniões: dificilmente mentem, dissimulam ou disfarçam. Esses pequenos-e-péssimos-pudores só adquirimos com o passar dos anos. Inclusive, muito me incomoda quando falam ser a maturidade uma das melhores qualidades que podemos adquirir com o tempo: nem sempre ela nos permite ser quem realmente queremos. Mais que isso, muito do que sonhamos se dissipa, amontoando em peso aqueles adultos frustrados.

De outro lado, é gratificante perceber que poucos (e bons) indivíduos nunca deixam de ser crianças. E ser criança é estado de espírito, que muito difere da idade do corpo. É, antes de mais nada, acreditar, não importa no quê ..

Poderíamos ser sempre assim ..

A cara de anjo às vêzes pode dissimular certa "bandidagem"... principalmente quando dão sinais de silêncio, os "não-sinais", preocupantes.

Comentários (clique para comentar)

Leonardo - 14/10/2015 (13:10)

por que não escreve mais no blog?

Clara - 14/10/2015 (11:10)

Texto delicioso de ler, com um inicio meio e fim bem discernido. Parabens Kita, vc sem duvida alguma promete como uma grande escritora, seguindo os passos do vovô Euclides. Bjocas.

Denise - 14/10/2015 (00:10)

Cada dia mais afiada no encadear das palavras e pensamento. Delícia de leitura!