Dr. Jeremias
De repente, mais que de repente, Jeremias se apercebeu de sua condição. Médico de sucesso, sala de espera cheia. Filhos contentes, de boa educação, dos quatro três seriam médicos, dois já prontos.
Corria, diariamente. Alguns quilômetros. Peso perfeito, para idade e altura. Bebia socialmente, mas realmente só e exclusivamente em eventos sociais. E jamais a comprometer a razão. Marido exemplar, até a sogra assim considerava (o que é realmente raro, mesmo sendo o sujeito o ideal para a filha...).
Grande irmão, filho adorado.
Deixara de fumar há anos, fazia seus exames com colegas, regularmente.
Amigo de todos e de muitos. Daqueles que se gosta convidar, não muito divertido, todavia aquela boa presença do "doutor", a quem todos desejam perguntar algo sobre verrugas, calos e tumores, rins, pulmões e inflamações.
Congressos, não perdia. Longos, sérios. A viajar com a esposa, sempre. Abrir-lhe a porta, cochichar, ajudar com malas. Quase antiquado, levemente machista no estilo: minha esposa está aí para a família e para mim.
Trabalhos publicados, aulas ministradas sempre com brilho.
Pois morreu Dr. Jeremias, nem 60 anos tinha completado.
Surpresa cruel para todos, a esposa-viúva porém com rosto pétreo no velório e enterro. Idem os filhos.
Sem choros.
E a bomba surgira, o Jeremias havia morrido em um raro congresso ao qual seguiu só, sem a mulher. Na República Dominicana.
Um rapaz a quem contratara para mostrar as praias alertou a polícia. O médico, com uns gorós na cabeça, resolveu se engraçar com uma mulatona gostosona, dessas que ficam esperando os gringos, mas sem serem profissionais.
Que topou a parada, mas no meio do bem-bom o coração do cardiologista, apesar de tantos exames preventivos, pifou.
Um filho foi buscar a carcaça com formol do homem, soube do ocorrido e reportou aos demais familiares.
E a sogra, na missa de Sétimo Dia detonou:
- "Eu sempre desconfiei..."