Os menos e os mais exigentes
O tema é curioso e reflete ainda um tanto da minha imensa curiosidade pelo estudo do homem, essa complexíssima criatura. Antropologia; deveria ter estudado, todavia agora é tarde. Perto dos 60 não tenho mais paciência com a burocracia acadêmica, nem tenho o pedigree para ir à escola de algum nível.
Porém fato fascina, é a questão dos menos exigentes. Criaturas entre nós seres humanos pouco pedem, sempre autônomas e evitando conflitos.
Maioria, na verdade.
E no enfoque democrático, alguns poucos muito exigentes acabam aterrorizando os demais, de forma a sabermos a origem de nos comportarmos como carneiros, atrás de um pastor (o exigente), que controla os cães. Não é à toa que a Cristandade a impor exigências a seus fiéis, por exemplo, usa os termos, diretamente.
Bobagens como Cordeiros de Deus, o Bom Pastor, o Cão e outros similares.
Os exigentes, e conheço alguns, conseguem projeção e domínio, mesmo negativo. É quase a regra. E entre eles se disfarçam alguns falsos modestos, alerte-se...
Stalin talvez tenha sido a pessoa mais demandante na história conhecida. Jamais um único ser pediu tanto (e foi atendido), até em atos como eliminar seus inimigos, prender, torturar. Absolutamente indiferente a qualquer demanda de seu povo, seus exércitos, seus próprios parentes.
Um único mal (ou bem) - intencionado desafeto próximo, com tiro certeiro, daria fim do problema. Pois Stalin, assim como seu inimigo nr.1, o estúpido Adolf, morreram de causa natural e suicídio, respectivamente. Até a absoluta exigência da intocabilidade era atendida. No caso do segundo, até sua ordem de ser queimado após o suicídio foi atendida, mesmo quase impossível conseguir-se alguma gasolina para o ato idiota e inútil.
Os muito exigentes pelo visto galgam os postos importantes (ou imaginam fazê-lo), as posições de destaque. Seus únicos opositores são a mãe natureza ou outro ser, ainda mais exigente.
A criminalidade do planeta (estima-se que 10% das pessoas viventes, adultas, são predadores com péssimos e violentos modos) é lastreada na exigência; o bandido sempre o é, exigente sem exceções.
"Passa a carteira"!
Por essa vida sofri um pouco com os ditos, todavia como bom carneiro sou, no conceito amplo de agnus dei, acabo me alinhando à maioria.
Porém sempre a observar.
Casos simples, como o eterno pentelho com assento reservado no avião pedir à aeromoça (e loucamente, sempre, ser atendido) trocar com alguém. O estúpido guarda de trânsito a exigir ao apresentar-se a carteira de motorista remover-se a capa plástica (ele não o faz...), ou a classe política a ordenarr o voto obrigatório ou manter-se a inútil fascista Voz do Brasil. Enfim a torcer o que deveria ser um direito (votar, não votar) para imposta obrigação.
Quando pequeno, qualquer imaginada exigência minha, se ventilada, era cortada na raiz. O processo educacional familiar, lastreado naquilo aprendido em duras infâncias dos meus pais na Baixa Saxônia, era bem eficiente. Bastava um olhar, uma única palavra e a demanda era engolida.
O permitido era exigir-se qualidade no próprio trabalho, nas notas escolares (problema seríssimo no meu caso) e asseio.
Já maior, certo dia comentei com meus pais jamais irmos a restaurante bom, ou passarmos férias em algum canto. Além do costumeiro esporro em irado tedesco, ainda ouvi o tradicional discurso sobre "não ser tão exigente"...
Funcionou, até hoje me sinto terrivelmente culpado quando saio de férias ou vou a um restaurante melhor...
Já certo ex-amigo, hoje convicto desafeto por saudável escolha (e seus pedidos não-atendidos), sempre mostrava-se exigente ao extremo. Criticava roupas, comidas, passeios e atitudes, demandando-as melhores, principalmente em quem observava ou convivia.
Terminava seus discursos sobre as questões, mormente dele, com a frase "então resolve isso aí para mim...". E, acreditem, sempre surgia alguém a resolver, o idiota aqui inclusive...
Somos assim.