Bratkartoffelnverhältnis
Palavra complexa no primeiro olhar, porém como em alemão frases viram palavras, traduzo mambembemente para relação amorosa lastreada em batatas sauteé. É específico e local dos alemães, mormente no norte daquele país. Algo expressa com precisão certa relação negada, porém real, entre seres humanos de sexos distintos, normalmente de idades próximas.
Ambos casados ou mentindo serem descompromissados, com certa deferência, respeito talvez, até declarado carinho amoroso. Todavia sem obrigações, interação social a comprometer ou interagir com outros.
Penso seja fruto da moralidade, a grande falsa moralidade vitoriana também assolou a Europa Central no século XIX, incluindo a soturna Alemanha. Por sinal, a rainha Vitória era filha de uma alemã. E sendo criada por babás daquele país, sofria até discreto bullying dos primos pelo sotaque adquirido, esse carregou por toda vida. Dizem sua sobriedade provir do rancor por isso.
Enfim, a relação batatosa é imediatamente reconhecida e pouco se comenta sobre ela, acordo de cavalheiros pan-europeu, entre damas também.
Um fornecedor da empresica onde trabalho se embanana com isso, a esposa descobriu sua relação de batatas, pediu divórcio e muito tutu. Doeu.
Outro sujeito, amigo, faz por anos. A esposa, desconfio, sabia há tempos, mas preguiçosa (sim, existem pessoas muito preguiçosas) jamais nada fez, tolera o sujeito até hoje.
Resignada, a lerda sempre me confidencia seu desprazer com a situação, mas "fazer-o-que-né"?
Sócios, na empresa nova um dos proprietários daqui está criando, associado a grupo alemão, o representante técnico teutão a resolver questões com certo fornecimento anterior à sociedade, aparentemente já se vira muito bem por cá...
Sondei, sondei e de repente confidenciou ser complexo resistir em terra brasilis. E tudo tão adequadamente longe da Alemanha, ele só, por alguns dias aqui... iniciou uma batatada bem frita com senhora casada, origem tedesca em cidade do sul.
Vai e volta, fritando os tubérculos em demorado sauteé...
Tenho sexto sentido para isso, um detector de relações embatatadas, à alemã. Veio com o sangue dos pais.
O perfil do sujeito é sempre de mais calmo, risonho, falante dos filhos, com alegria. Lembra sempre de suas obrigações com a família, diz que isso e aquilo é sagrado. Todavia em determinado instante, com um sorriso maroto, quando meu detector sinaliza o sujeito ou sujeita estarem batatando, revela o clássico sim-tem-alguém-pessoa-boa-mas-sem-compromisso...
Em certa época da vida, traía minha namorada. Com duas outras discretas moças. A namorada era algo quase marital, de levar a festas, apresentar, ter os compromissos. As outras duas eram Bratkartoffelnverhältnisse, coisas surgidas não por eu ser garanhão conquistador. Mais por conversas interessadas, de ambos os lados, e, por fim um irresistível approach. A namorada vingou-se, sabendo dos temas, de uma forma que prefiro não detalhar. Não foi bonito.
Passei a régua em meus Bratkartoffelnverhältnisse (os plurais em alemão me matam...), casei com outra.
Mas o detector continua funcionando, somos assim.
Em tempo, a rainha Vitória tinha um discreto relacionamento de batatas sauteé, com coronel escocês cuidava de seus cavalos...
A origem do termo do título estimo seja do homem burguês com bom casamento e regras de certa precisão, até no que toca à alimentação, em algum momento ter determinada relação com alguém lhe faz aquilo mais deseja, a simples comida caseira. Entenda-se com quiser.
E para os alemães, as Bratkartoffeln (batatas cozidas de sobras, em rodelas, fritas com cebolas, bacon e às vezes ovos mexidos) são o que para nós é o arroz e feijão, com bife.