Na moda
Vejo aqui foto de bela senhorita, sentada em banco de praça qualquer.
Loira, toda na moda, imagino, da época. O ano: 1951. Acabara de chegar ao Brasil; passeando com o noivo no Rio de Janeiro batem a "chapa"; em pausa a verificar as belezas tropicais da terra, sem antes, excetuado certo período no podre reino da Dinamarca, ter posto os pés fora da sua nativa Alemanha.
Minha mãe.
A foto conheço bem, vejo de tempos em tempos; surge como lembrete da origem, da chegada; e da coragem. Sim, a coragem bastante diferenciada que desenvolveu, em contraste com o que chamar-se-ia normal. Me alongo mais adiante.
Porém, pela primeira vez, atentei aos detalhes na foto.
As luvas escuras. Algo quentes para nossos trópicos, porém a elegância pelo visto requeria algum sacrifício. Por cima de um dos punhos dessas, o relógio. Chique.
Os óculos de sol à la Marilyn Monroe, paradigma das loiras de então, se não me engano. Bem pretos, em borboleta. Brincos a ornar as orelhas pequenas, o cabelo levemente cacheado, preso em um dos lados. Batom, realçando com leve esforço a boca de certo traço amargurado impresso, até hoje presente. A bolsa a imitar couros de cobra; a saia e a sobre-saia (seria isto?) discreta, com estampos (floridos?); a blusa leve, aberta até o ponto certo e decente; mas toque sensual, entretanto; com fino ajuste ao calor carioca.
As adoradas e sempre presentes, no pós-guerra, meias de nylon americanas, em tom escuro. Sapatos, não sei se há modelos já padronizados a descrever os da época: combinado de sandálias com pisantes mais rigorosos dos teutões.
A cabeça elevada, olhando pela frente uma vida com suas realizações “latino-americanas”, após os duríssimos anos em tenra idade pela Europa, na pauleira.
Vinte anos tinha a moça. Hoje 77.
Permanece moça, apesar do peso dos anos. No pensar, nos desejos.
Aos 12 é enviada para uma escola no reino de Hamlet pelos nazistas, sua saída de casa. Retorna, dissolvido o local e fugidos os mestres, só, entre ataques aéreos, aos 13 anos, até à vila nativa, a procurar a mãe. Entretanto já é setor russo com suas péssimas referências no trato com alemães; procuram o setor inglês. Conseguem, em noite e neblina. As escolas reabrem, estuda. A mãe falece, ela 18. O pai soldado desaparecido nos Balcãs, nunca mais deu ares. Já noiva, o futuro marido é transferido ao Brasil. Somente dois anos após lhe permitem casar e ir ao encontro do amado; regras da empresa (!). Por fim o reencontro, muito trabalho, filhos, a viuvez precoce aos 49 e hoje uma vida penso mais tranqüila.
Sem bombas, sem fugas, sem parceiros a perder.
E um pouco menos na moda; não se interessa mais por estes assuntos.
Com razão, somos assim.
JORGE DOS SANTOS - 18/04/2008 (10:04)
Nada a ver com o aterro. Pode perguntar a D.Ursula: o local é a Av. Paulo de Frontin, lugar elegante na época e hoje terrível, com um viaduto sobre ela e próxima do conjunto de favelas do Catumbi. Lugar tranquiiiilo...
Otávio - 16/04/2008 (15:04)
Hermo,
Esse local fica onde é hoje o Aterro, possivelmente próximo de onde desemboca a Av. Rio Branco.
Hermógenes - 09/04/2008 (21:04)
Lindo texto,cara amiga Lucia. Emocionou a senhora.
Lucia - 09/04/2008 (09:04)
Muito legal a foto, de época mesmo, essa vai para meu album.
Como as mulheres eram femininas... a fotos de minha mãe jovem e praticamente da mesma época também era assim; eram lindas e tinham o seu lado sensual, os homens charmosos com seus ternos e chapéus em plena luz do dia, no dia-a-dia.
Quanto à D.Ursula, merecido seu texto; a admiro como empresária, mulher e principalmente amiga. O importante foi ter adquirido nesses muitos anos o amadurecimento e a sabedoria em todos os momentos que os anos lhe ofereceram.
Imagino a felicidade dela em ver o texto escrito pelo filho.(coisas de mãe!).
Hermógenes - 09/04/2008 (08:04)
Transmitirei a ela, cara Gelinha. Tem ela em si grande admiração, como sabe.
Hermógenes - 09/04/2008 (08:04)
Tens razão, caro George! PT é daqui, Lula é do Pernambuco, mas apaulistou-se, são-bernardou-se. FHC, carioca, também fala caipiramente, é cria daqui na formação. Collor viveu , cresceu e estudou no Rio , mas é cachaceiro, digo, cangaceiro das Alagoas. Itamar dizem é diferente, coisas de Juiz de Fora, perto do Rio; me parece. Sarney é maranhanse e escritor, portanto acima de qualquer crítica. Sempre. A quem substituiu, Tancredo, mineiro, fica apenas a nobreza de ter sido o mais nobre falecido do InCor paulista. O presidente que não foi. Figueredo, gaúcho, mas carioca até os dentes. Geisel, barriga verde, era filho de pastor alemão, au, au! Adorava o Rio. Medici gaúcho, perigoso e acariocado. Costa e Silva era bobo; e gaúcho. Mas a patroa, Yolanda, era carioca.... e perigosíssima. Castelo Branco era cearense, bastava ver o perfil anti-dolicocefálico do sujeito. Goulart gaúcho, uma lástima, sem pulso, podia ter feito mais, perdoavel por ser cardíaco, respeite-se a doença. Jânio era louco: e matogrossense, mas apaulistado da Vila Maria. Kubitscheck era ladrão; e mineiro, mas morava no Rio, morreu indo para lá na Dutra. Portanto, nessa pan-brasileiridade, não sobra um sem críticas. Mas algo certo: todos adoravam o Rio. Até Lula adora, quando vejo abraçar o fabuloso, o imbatível, o sempre dedicado, o infalível Cabral.
Angelia - 09/04/2008 (07:04)
Li o artigo porque logo imaginei se tratar de D. Ursula. Impecável mulher! Visível inteligência, beleza e feminilidade. Passo a entender melhor minha amiga, muito além da sua germanidade.
Gostei de vê-lo fazer jus à sua mãe que sem dúvida é muito singular e sobretudo corajosa. Bj.
JORGE DOS SANTOS - 08/04/2008 (21:04)
Ah, foi um chiste? Mas estamos tranquilos no que se refere ao preconceito paulistano/paulista. Afinal, vocês produziram o que há de pior no país: o PT, o Lulla e a propagação da música sertaneja. Eheheh!!!
Hermó - 08/04/2008 (19:04)
Sabia que o mancebo ia se irritar... foi propositado, he, he...
JORGE DOS SANTOS - 08/04/2008 (18:04)
Pena a tão desnecessária observação do “papel no chão que é típico dos cariocas”, mas como bom paulista (Oh! Desculpa-me. Esqueci-me da rivalidade que também existe entre vocês mesmos. Vocês são paulistanos. Paulistas, como o inferno, são os outros.) não poderias perder tal oportunidade, não é mesmo. Mas será que não pensavas na tua Praça da República, por exemplo?