Olá, colega eleitor coercível,
leio aqui (Folha de São Paulo, 27.03.2008) primoroso comentário assinado por Régis Bonvicino. Diz o bom e atento homem, escritor e juiz eleitoral: “O voto é facultativo aos adolescentes de 16 a 17 anos, uma das maiores conquistas da incipiente democracia brasileira.”
Concordo, mormente pela questão facultativa.
Pena a nós adultos brazucas, curioso estado a que nos transmutamos em questão de segundos no fazer dos dezoito anos, o mesmo não ser permitido.
O Brasil é dos pouquíssimos países onde o voto é fruto de chantagem oficial, obrigando-se o cidadão, ao contrário das verdadeiras democracias, exercê-lo sob coação. Não é direito; é obrigação imposta por lei, a impedir suas habilitações outras, como o direito de ir e vir, declarar seus impostos, trabalhar, etc. se não for atendido o determinado. “Vote, cidadão. É obrigatório, por lei!”
O “título de eleitor” em conseqüência é documento também obrigatório, curiosamente até para a emissão de passaportes, a determinar se pode ou não sair do país.
A classe política argumenta se fosse a nós facultado, e não imposto, o ato de escolher nossos dignos representantes ninguém iria à votação , rotulando-nos todos portanto de brasileiros preguiçosos e irresponsáveis .
Não lhes ocorre ser o voto raivoso, pela obrigatoriedade chantageada, o detonador de votos nulos e brancos? Equivalentes estes, me parece, aos valores percentuais, nas verdadeiras democracias, de quem não exerce o direito?
Porém por cá nossos “dirigentes” pensam diferente. Com razão em causa própria, pois o voto forçado garante-lhes a participação da população mediante coação. E declarações compreensíveis dos eleitores como “melhor ir para não ter problemas depois, justificar a ausência ao sufrágio é chato, preciso dos documentos, tentarei votar no menos pior, porque só em feriados em não em dias comuns como nos outros países?”; e por aí vai.
O sistema, curiosamente, dentro de sua obrigatoriedade, é de eficiência nórdica. Totalmente eletrônico, rapidíssimo, com regras draconianas, a alcançar os confins da Amazônia, com propaganda de urnas eletrônicas em botes indígenas.
Fico a imaginar tanto esforço empregado para, por exemplo, equipar nossos postos de saúde...
Nasci em 1956, sou eleitor, a tal obrigado desde os 18 anos e com orgulho posso afirmar: anulei todas as vezes; protesto solitário pela obrigatoriedade. Com uma curiosa exceção: em 94 a pedido do sogro, político, recém-operado, votei em seu singular herói Luiz Inácio, por impedido estar.
Fui convocado mesário (outra chantagem, com ameaças pesadas; leiam se acessível a “simpática” carta de convocação, aliás hábito de órgãos públicos mundo afora, os termos sempre ameaçadores) e observei os semblantes contrariados de muitos eleitores, enraivecidos com o eterno exercício de poder até naquilo os faria felizes: votar em bom candidato, como direito. Não como obrigação.
Felizes os jovens , Excelências, esses o exercem facultativamente, como bilhões de cidadãos em outros rincões deste planeta.
Para nós exceções, os adultos brasileiros, somente a lei e as sempre solidárias ameaças ou impedimentos decorrentes.
E nada fazemos, somos assim, carneiros. Alguém no passado distante, ao ouvir dos legisladores em brancas togas sobre a desejada coerção ao voto, pelo estado, tolhendo outros direitos se este não cumprido e a simplicidade de assim conseguir-se mais votos dos cidadãos, declarou:
"A democracia se encerra onde se inicia o voto obrigatório."
O Senado pensa nisto, basta ir a Propostas do voto facultativo, mas na velocidade aquelas instituções andam, talvez meus tataranetos tenham lá suas chances de jogar o papelzinho verde no lixo.