Um tipo estranho de adultério
Por Duodêncio Dêcio (*), de Salvador
Todos nós já ouvimos falar em casos e casos de "adultério", de um parente ou amiga que já foi vítima ou promotor da "traição" de homens ou mulheres. Eu já conheci tantos exemplos, mas lembraria aqui alguns: uma colega casada que transava com um padre, um primo meu que agarrava a irmã gêmea da esposa, uma conhecida que chifrava o marido com um animal doméstico, um tio casado que namorava escondido com a sobrinha, uma sogra que se divertia com o motorista, uma cunhada que encontrou o pai de seus filhos na cama com um macho, enfim, tem de tudo no reino da "traição". Essas pessoas não fazem isso por desprezo à companhia ou por maldade; o fazem por prazer, por diversão, para sair da mesmice. Acredido que os adultérios até são úteis para a manutenção dos casamentos ou namoros, na medida em que as pessoas renovam as energias em ambientes geralmente mais saudáveis e confortantes.
No momento em que digito nesse teclado e você acompanha essa leitura, existem milhões de seres humanos praticando "adultério", que não é invenção do homem moderno. As mulheres que avisaram a você que foi ao shopping, provavelmente o seu carro ou o dela está lá numa garagem, o que comprova apenas que ela esteve por lá. Ali é apenas o ponto de encontro que vai levá-la a um dos centenas de motéis espalhados pela cidade, ou se não, no apartamento do Ricardão. Se seu marido disse que ficou no trabalho até mais tarde, provavelmente ele está trabalhando em cima de uma caminha bem gostosa, com uma criatura bem mais atraente que você.
A propósito do "bem mais atraente que você", presenciamos eu e você, muitas vezes, uma mulher dizer assim: "se ele escolhesse uma melhor do que eu, tudo bem, mas ele escolheu uma bem pior." Vejam só que conversa mais boba. Homens e mulheres quando traem, eles tem preferência por encontrar carnes mais saborosas, é verdade, mas isso não descarta a possibilidade de beliscar peças menos valiosas. Então, a questão não é se é melhor ou pior, a questão é que nós seres humanos não gostamos, no geral, de apenas uma opção em nossos gostos por diversão e fim de papo.
Um outro aspecto que devemos trazer para a conversa é o ciúme exacerbado de ambos os sexos, ao imaginarem a possibilidade de seus parceiros estarem se divertindo em parques outros. Alguns falam: "eu não consigo imaginar minha parceira/meu parceiro fazendo as mesmas coisas que fazem comigo com outras pessoas." Quanta bobagem. Não sei se lhe conforta leitor, mas quando eles fazem, fazem até pior. Alguns estudos indicam que no caso das mulheres, elas se liberam, ficam bem mais à vontade, quando estão com o outro. Inclusive falam que no caso do sexo anal, que ainda é um tabu em boa parte de Bruzudanga, este se realiza com mais frequência fora da relação formal. E uma pessoa ficar a imaginar o que seu marido ou esposa possa estar fazendo com outra criatura é uma enorme perda de tempo, convenhamos.
Um belo filme mexicano que assisti, "A sua mãe também" de Afonso Cuarón, relata a história de dois jovens que viajam de carro em férias para o litoral com uma bela mulher, mais velha, que está prestes a morrer sem eles saberem. No percurso eles se divertem pra valer, ela namora com os dois e tenta conciliar os entreveros entre os machos. Numa das bebedeiras, um deles anuncia ao outro que teria namorado com a noiva dele. Esse menino entra em parafuso quando sabe do "adultério" e fica adulterado durante o passeio e o tempo inteiro perguntando ao amigo o que ele teria feito com a noiva. Depois de tanto insistir o garanhão fala: - tá bom, ela só chupou meu p... - Como? Minha noiva chupou seu p...? Mentira. Não pode ser. - Calma, não foi assim como você está pensando. Ela só chupou a cabecinha. Ao final do filme a vítima vai revelar ao predador que comera sua mãe. Esse breve relato é só pra ilustrar a loucura das pessoas pensando no que fazem ou fizeram seus parceiros numa relação sexual extra.
Com o decorrer do tempo consegui aceitar que minhas namoradas ficassem à vontade com outros parceiros. Digo sempre a elas: - fiquem à vontade, mas não me largue, e desde então, nenhuma mais me abandonou. Concluí depois que só não perde a mulher, quem é "corno consentido." Mas antes de me adaptar a essa nova situação, eu passei por alguns poucos momentos de ciúme, uma doença que se não bem adminstrada pode provocar mortes. Eu costumo dizer às pessoas, que se um doente fuçar sua caixa de mensagem ou fiscalizar suas ligações telefônicas já é hora de despachá-lo. Figuras que fazem isso, mais adiante podem fazer coisas horrorosas em nome do amor, como alguns que fazem em nome de Deus. Os jornais todos os dias estampam manchetes de casos assombrosos de assassinatos provocados por pessoas pervertidas psicologicamente, que pensam que a namorada ou namorado é propriedade privada.
Na época dessa história era apaixonado eu por uma menina moradora do Bairro de Amaralina, orla de Salvador, e ainda não tinha sido curado do ciúme. Tinha a mocinha 19 anos quando a conheci e fui o primeiro a iniciá-la na vida do amor. Namoramos mais de dez e nos separamos até o momento em que aconteceu o flagra. Mas não foi qualquer flagra, foi um flagra e tanto. Você já ouviu falar de muitos desses, mas desse tipo, juro que não. Ela tinha a chave do meu apartamento e eu a do dela. Ficara eu amigo do porteiro do prédio e ele ficava o tempo inteiro a me alertar sobre corpos estranhos que estariam visitando a cama que dividia eu com meu amor. Eu dizia que era mentira, mal entendido, fofoca etc, até que um dia ele me disse que o funcionário que recolhe o lixo teria ouvido sussurros no local quando eu não estava lá.
Então eu passei a ir no apartamento dela sem avisá-la e sempre a encontrava só ou ela não estava. Meninos, mas... aconteceu. Chego num sábado à tarde e quando encosto a porta na chave da sala começo a ouvir os tais sussurros. Fiquei numa dúvida se entrava, pois queria matar o desgraçado que estava a fazer coisas horrorosas com aquele corpo escultural que descobrira eu , que o treinara, que o preparara para a vida. Não era aceitável depois de tanta experiência transmitida aparecer um figura do nada para me provocar dor e sofrimento. Por outro lado pensava: - mas esse cara pode ser um simples Zé Ruela, uma p... voadora qualquer que depois some no mundo, para ela apenas uma diversão momentânea.
Com a chave pronta para abrir a porta fiquei a matutar e fui me convencendo que ela tinha seus motivos, que conhecer um homem apenas durante uma década num tinha graça mesmo, que terminado o sexo ali ela seria toda minha. E me convenci mesmo que não a abandonaria por isso, que eu também tinha minhas presas pela cidade além dela. Mas a curiosidade de ver a cena era tamanha que não me fazia retirar a chave e retornar. Decidi entrar e quando adentro a sala os gemidos altos começaram a me incomodar. Ela dizia: - ai que delícia, deliiiiiiiiicia, ai que gostooooooooso, deliiiiiiiiiiicia, gostooooooooooso. E quando eu me aproximei do corredor percebi que aquele sexo desregrado acontecia no banheiro. " Poxa, aquele filho da p... está comendo minha nega embaixo da ducha", pensei. Canalha, safado, tarado, indecente, foram os adjetivos recolhi para insultá-lo. Nesse momento minha nega começou a gritar: - vou gozar, vou gozar, ai que bom, ai que bom!!!. E aí adentrei o banheiro com todo ódio do mundo. E ela estava sentada no vaso usando o chuveirinho para ter orgasmo.
Depois disso não quis mais vê-la. Ser traído por um macho é até aceitável, mas por um chuveirinho de privada é o fim da picada. Para encerrar soube que ela anda espalhando por aí que aquele chuveirinho é muito mais gostoso do que eu, no que ela deve ter razão.
(*) Duodêncio Décio é vendedor de milho assado no fim de linha do Alto de Coutos, subúrbio ferroviário de Salvador.