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Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Agradecer, jamais.

Conversando com o responsável pelo departamento de recursos humanos da firminha onde trabalho, após me lamentar sobre meu péssimo salário, porém sem chances de melhoras, o pobre homem acabou tecendo soturnas conjecturas sobre o cotidiano naquela área.

Trabalha há 16 anos na administração, confessa de um total talvez de 100 pedidos de aumentos recebidos nesses anos todos, e quase 90% atendidos, somente de duas pessoas (ironicamente dele mesmo e um outro gerente) ouviu frase de agradecimento, pela deferência cumprida ao solicitar-se.

Dos demais, nada.

Saí pensativo do encontro. Seria ingratidão?

Ou há momentos que nos alegramos com algo conseguido, a tal ponto esquecemos da frase normalmente proferida por uma mãe zelosa: filho, não se esqueça de agradecer! Na outra ponta, quando algum pedido é negado, ouvimos com alguma freqüência na mais azeda ironia: muito obrigado, viu; não vai fazer falta?

A razão é meio brasileira, com todo respeito aos meus conterrâneos. Temos certa dificuldadezinha com o agradecer, basta verificarmos nosso trânsito (raramente cedemos a vez ou buzinamos agradecendo gentilezas), nossos políticos quando eleitos somem; ou também de colegas de trabalho, mais comum ouvir de terceiros ser o babaca cedeu a vez do que ouvir alguém agradecer o plantão assumido pelo outro.

Não sei a razão, sinceramente.

Em recente programa de TV, um famoso violonista relembra da simpatia gaúcha, ao poder-se ir à casa de um vizinho ou amigo, sem grandes anúncios ou convites lá pelo sul. Idem no Nordeste, são bem mais receptivos.

Já nós paulistas e cariocas, cheios de discretas formalidades e desconfianças, adotamos aquilo que o Peter Kellemen em seu "Brasil para principiantes" descrevia engraçadamente: "Se alguém no Rio ou São Paulo disser : passe lá em casa, significa: não apareça. Ou: vamos tomar um café um dia desses. O ´dia desses´ é após o Juízo Final...".

Exagero?

Talvez, mas somos um pouco assim... não somos?

Como era imigrante o autor e um tanto irônico com brasileiros, os milicos proibiram o livro. Em casa ficou escondido, lembro disso. Hoje acha-se nos sebos. Desatualizado, mas o cara pescou bem nossa forma de ser.

Comentários (clique para comentar)

- 30/08/2011 (07:08)

Ressentido... com certeza. O ressentimento faz parte de nossa alma. Além disso, caro anônimo/anônima, se de pura origem paulistana, faça as contas de quantas pessoas visitou ou convidou nos últimos anos...

- 29/08/2011 (11:08)

Ressentido você...