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Bem-te-vis, lavadeiras, rolinhas fogopagô, carcarás, micos, galinhas, lagartixas e demais vizinhos aqui na distante praia levam, com algum venerado silêncio humano e o rugir do mar, os pensamentos a outras plagas.
Até o problema com o equipamento a não funcionar direito lá por Minas e pedidos perdidos, enfim: assuntos que me acompanham há tantos anos, atenuam-se por cá. De fato, seriamente, a pensar uma terceira etapa da vida aqui. A conferir, como diziam antigamente.
Não é muito que se necessita nessa vida, entretanto corremos e trabalhamos como se precisássemos de tudo. Colecionamos inúmeros bens, relações, provisões e ao avaliar com certa sobriedade, podemos descartar, sem prejuízo, 99%.
Nessa saída da rotina para o aniversário de 80 anos da minha mãe, ao observá-la em seu desinteresse pelo que ocorre ao redor, chego a essa conclusão. Ela lembrando apenas do distante passado e de coisas simples, necessitando de tão pouco atualmente, excetuada a deplorável, segundo ela, bateria de medicamentos, alguma ajuda de dedicada doméstica e dizendo a mim, ironicamente, que todos querem envelhecer.
Mas ninguém quer ser velho...
Foi-se a vaidade, a procura por reconhecimento, o desejo pelo ultra-conforto material, colecionar paisagens vistas e saber de filhos prontos e “estudados”. O noticiário é irrelevante, Gaddafi não desperta curiosidade. A refeição é importante, um proibido cigarro, muito sono e a errônea ilusão em não se movimentar o desgaste ser menor. Deitada, vendo horas passar a olhar o mar.
Despedindo-se à sua maneira, sempre pausadamente, sua meta em vida.
Disso não abriu mão, é assim.