Foto do Hermógenes

Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Rio, um pouco frio...

Por Ildásio Tavares, de Salvador

Aline e Maurício foram me buscar no Galeão de manhãzinha. E, de manhãzinha mesmo, a gente caiu na estrada. Cachoeira do Macacu, com perdão da má palavra. Em busca do candomblé do famoso Pai Zé Flávio, que acumula as funções de antropólogo e professor das duas mais importantes universidades dó Rio de Janeiro, a UFRJ e a UERJ.

Nas horas vagas, Zé Flávio escreve livros sobre a cultura negra, área onde sem dúvida é Doutor.

Aline é uma velha amiga de um desses sites de conversa, em que se consola um velho poeta abandonado. Por sua natural verve e bom humor, julguei que a guria fosse carioca. É gaúcha. E das boas. A cada 3 minutos soltava um buenas e eu não pude deixar de tratá-la de Che, Che Aline sem Guevara, menina ativa e excelente anfitriã, fazendo as vezes da casa quando, após uma longa viagem pelo Estado do Rio, chegamos ao frondoso terreiro de Zé Flávio.

Frondoso é apelido. Um bom trato da Mata Atlântica preservada, terreno de primeira, as árvores grossas, desmedidas, inclusive Iroko e Apaoká, belos, engalanados com seus ojás e rodeados de suas oferendas votivas. Encachoeirado, por uma miríade de pedras arredondados, corre um lindo rio com seu murmúrio ancestral, inundando o ar de refrigério.

Um sítio perfeito para o culto dos orixás. Zé Flávio está no paraíso, pensei, lembrando-me de outro Éden, enquistado no cinturão urbano, 155 mil m2 de terreno, boa parte de Mata Atlântica e que acaba de fazer cem anos de glória, meu terreiro, meu Axé Opô Afonjá . Nesse Ilê reinam soberanos Mãe Stella, estrela rainha e sua nobre corte dos 12 Obás de Xangô, criados por Mãe Aninha, cujo lindo busto acaba de ser inaugurado, lavra desta bruxa do bronze Márcia Magno, provando que ainda existe arte de respeito na Bahia. Em tudo no ilê uma azáfama familiar de preparação para um Xirê , no caso a Fogueira de Ayrá, santo do Babalorixa Zé Flávio que ocorreu à noite até altas horas da madrugada, num clima de empolgação, após o que todos foram repousar – a casa entupida de esteiras pelos quartos de devotos que vinham de longe, como eu que viera da Bahia, direto do aeroporto a convite de Aline.

No outro dia, zarpamos após um lauto café da manhã. Fui tratado a velas de libra, reconhecido como Ministro de Xangô, Oba Aré que sou, priueiro da mão direita neste meu Axé de cem anos de grandeza, podendo empunhar o xeré. Zé Flávio me convocou duas vezes ao meio do salão. Uma porque me sabia Ogan Omi’l’Arê na Casa de Oxum, o mais antigo da mesma casa e outra, brandindo o Adjá, declinando minha condição de Ministro de Xangô. Na primeira vez, mostrei meu másculo giká, e na segunda um movimentado alujá. Fui dormir cansado em meus 70 anos, mas feliz. Tinha reverenciado meus santos dançando para eles.

E lá fomos,em busca da Cidade Maravilhosa, rodando o interior do Rio,cruzamos a ponte Rio-Niteroi, no volante, nosso Airton Senna, Maurício, sete cordas do trio Madeira, estourado no Rio, CD novo, 27 de agosto no TCA, sob a égide dos competentes amigos Adailto e Yeda,de Ipirá, terra de gênios, vide Eugênio Gomes, Joaci, Darlan e Dr. Cintra.

1 É uma terra violentíssima, mas tem seu lado lúdico.

2 O sincretismo, complicada relação do passado escravo com a confusa noção de santos católicos, oriunda da forma de idolatrar-se os deuses romanos.

3 Mas sempre abençoada, a Cidade Maravilhosa.

4 Porém seus melhores expoentes não precisamos citar, apenas observar.

Comentários (clique para comentar)

- 20/08/2010 (08:08)

Belas retaguardas!

- 09/08/2010 (16:08)

E´, Hermo´, ´as vezes o Rio poderia se chamar de Rio das Bundas... Ou Bundólia.