A refeição preferida é...
Tenho um hábito, desde jovem, perguntar a amigos e parentes qual a refeição preferida. Talvez forma de criar certa proximidade, quando a pessoa fala sobre questão quase íntima, aquilo se ingere preferencialmente.
Alguns são ecléticos, dizem gostar de tudo e citam uma ou outra exceção. Outros, categóricos, dizem adorar o prato tal e tal. Com ênfase e endosso. Já certas pessoas esculhambam e citam refeições tenebrosas, de gosto duvidoso, e dizem adorar. Muitos entretanto têm o gosto similar, a maioria.
Cito algumas preferências deste último grupo, disparado à frente o apanhado das frituras de carne, frango ou peixe: nas formas milanese e parmigiana, campeãs absolutas. Segue a feijoada, picanha no churrasco e por fim a pizza ou sushis. Estas refeições dominam o gosto Brasil afora. Com variantes regionais, claro.
O feijão com arroz é diário, todavia não é o preferido na questão do gosto. A redundância cria o hábito, porém não a preferência.
E suas exceções claro.
Certa amiga de Ribeirão Preto contava um parente seu, homem abastado e de hábitos modestos, confrontado com extensa viagem pela Europa revivendo distante lua-de-mel, em pânico haver refeições estranhasse, levou a cozinheira a tiracolo. Que, abastecida de feijão/arroz na mala, preparava, após conversa com os cozinheiros dos hotéis, o repasto diário do pobre homem e sua rica monotonia culinária. Aliado a louco procurar de grande jornal paulistano nas agências da companhia aérea famosa à época, com escritórios mundo afora.
Idem na distante Ipiaú, zona da mata baiana, onde rico fazendeiro de cacau jamais comia algo distinto de arroz-feijão, farinha, bife e salada de tomate. Com suco de laranja. Às vezes churrasco. Se estiver vivo deve permanecer nesta dieta, homem de rigidez tal, faria de Cromwell dançarina de boate desbocada, se comparados.
Meus pais adotaram a rara feijoada com alguma resistência, era próximo da comida pouco criativa do norte da Alemanha onde cresceram, com suas peças e lingüiças do porco.
Porém feijão e arroz diário, neca. Somente batatas. Alguma carne bovina estufada, ovos cozidos na mostarda com batatas inteiras na casca, purê de batata com salsichas, carne de porco em aspic com pão preto e molho agridoce de cebolas, arroz doce quente com manteiga derretida e canela (como refeição) e, depois da ascensão econômica, filé de boi ao forno, com batatas e molho de cogumelos ou de cebolas, em dias especiais.
E, nossa alegria de crianças, macarrão cozido, apenas com quetichápe, de vez em quando. No Natal o único prato meu pai fazia, o Heringsalat, salada de arenque em salmoura com ovos picados, frango desfiado, maçãs, alcaparras, pepinos em conserva e por aí vai. Mas a dele era deficiente, salgava demais. Eu gostava; porém a da avó, lá na distante Braunschweig, era o pitéu verdadeiro.
Uma das minhas preferências culinárias, fruto da educação que somos. E do meio.
Pessoalmente como de quase tudo e adoro. Algumas mínimas exceções como fricassé de frango, gororoba horrorosa, mininico de carneiro (as tripas do carneiro enroladas nos calcanhares e patinhas do animal, como trouxinhas cozidas e servidas com pirão do caldo dos miúdos), molejas, o timo hiperdesenvolvido de bois jovens grelhado, comum na parilla argentina, pudim de sagu em vinho tinto e, para tirar-me da mesa sem apetite, alguém chupar ovos crus ou derramá-los por sobre a comida, como no sukiaki.
Ou misturar a salada com o prato principal, hábito abomino, muito comum porém, portanto respeite-se.