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Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Ébria eternidade... continua 3

Por Julia Bussius, de Salvador, Bahia.

Sua primeira noite com Lola foi algo de êxtase quase cruel, o que não sentia em anos. Vampira ou não, a secular companheira fazia estrepolias com certeza aprendidas entre as cariocas de várias gerações atuais e passadas, conhecidas mundialmente por suas liberalidades e sofisticados jogos eróticos. Lembrou de soldados americanos em férias do Iraque: ao invés dos dias com a família, passarem parte deles em noitadas no Rio.

A dado momento, a danadinha anciã, mesmo sendo relativamente “jovem” para o gênero hematófago, aproximou-se de sua jugular com aqueles bonitos, entretanto longos caninos, queria algo mais além do enlace carnal. Carne e sangue, maybe?

Porém recuou, ao ver o assustado olhar de Raul e retornaram às práticas normais entre vampiros, quase humanizadas.

Com o passar dos meses não paixão, mas profundo bem-estar na convivência entre ambos tornou-se motivo de alento para Raul. Perguntava com freqüência como era a questão da eternidade, assunto que o fascinava. E do efeito Batman, a poder voar através de certo mimetismo com morcegos. Lola em seu manso sotaque e às vezes perdido olhar (como das pintoras, sua ocupação principal, de algum talento) dizia ser tudo possível. Ensinava que havia eternidade em vida e eternidade em morte. Ou seja: vampiros também morrem, passam à eternidade, esquecidos. Para tal bastaria uma bala de prata, dentes de alho enfiados nas narinas e cravos de madeira no coração, além de crucifixos, balançados ao nariz, poderem ser fatais. Ou os temíveis banhos de sol...

Em vida era seguir com o cotidiano, evitar a luz do dia em demasia, as balas e os demais. Não sabia de doenças em vampiros, mas um médico mordido, clinicando em Madureira, recomendava alguma cautela com aidéticos, o assunto era pouco estudado; e cuidados com a transmissão da raiva. Alguns vampiros esfomeados, desempregados e pelos morros se atirariam à cães; e estes são transmissores, portanto poder haver infecção em mordidos. Hidrofobia derrota vampirismo. Nada de imortalidade, nestes casos.

As primeiras aulas de vôo com Lola foram complexas, o rito da decolagem, a dolorosa diminuição do corpo pela bizarra metamorfose hominídeo-morcego e o desviar de postes e fios de alta-tensão. Mas com o tempo apreciava àquilo, certa leveza e encantamento eram inegáveis, quando em dupla circulavam por cima da baía, ao redor do Corcovado, por baixo da Rio-Niterói, com cuidado para não serem fritos ou aspirados pelos jatos da Ponte-Aérea.

Lola, vampira tão linda, quando metamorfoseada era horripilante, com seus olhinhos vermelhos e as orelhas gigantes... Continua.

A beleza vampiresca atordoava Raul.

Mas os vôos noturnos sobre a linda cidade, metamorfoseados em morcegos, era algo de sumo deleite.

Comentários (clique para comentar)

- 30/11/2009 (09:11)

Liberdade literária... Nem um nem o outro existem... portanto cunha de madeira ou bala de prata? Quem se importa?

Daniel - 28/11/2009 (01:11)

Bala de prata é coisa de lobisomem...

Hermógenes - 27/11/2009 (10:11)

Um privilégio ajudar na bela história!

Julia - 26/11/2009 (22:11)

Esse trecho é by Hermógenes!!!

Lia - 26/11/2009 (11:11)

Adorei, muito bom! Aprecio estorias vampirescas, as vezes, ate penso que so uma.... rsrsrsrs!

Cornelia - 26/11/2009 (11:11)

Tinha muito morcego lá em Busca-Vida?