Observações de um não-observador
Tempos de crise (ela continua, tenham certeza...) detona certo fenômeno distinto: há mais festejos. Nos últimos tempos, quase como sintoma social, fala-se de e faz-se festa, mais do que o normal, assim este não-observador acompanha.
No livro de Joachim Fest sobre o fim do terceiro reinado alemão, o da nazistada, descreve-se as festas a jovem namorada de Adolf H. Eva Braun promovia, no bunker e na chancelaria. O filme correlato, Der Untergang mostra as cenas, possivelmente bem próximas de fato ocorreu, interessante assistir. Em vista daquela situação desesperadora porém relativamente estável até o fim abrupto, as festividades aliviavam as tensões.
O comparativo seria exagerado, mas penso a atual crise, minguando ou recrudescendo (alguém sabe?) não possa de alguma forma contribuir para tal? E os grandes e muitos recursos colhidos nos bons tempos são agora aplicados também em lazer e ritos, independente da situação, em algo dir-se-ia, “agora sim, e com vontade; afinal o que sabemos do futuro ?”
Não sei, são pensamentos apenas.
Festas de 50 anos, casamentos, boas vindas, despedidas, 15 anos, churrascos, jantares e aniversários num acúmulo penso sem precedentes. Em alto estilo, fartura quase vergonhosa, pelas quantidades ofertadas. Roupas extraordinárias, comidas exóticas, bebidas distintas. Certo luxo até e o grande consumo: algo como metalúrgicos indo ao paraíso, em conotação maldosa mesmo.
Entretanto notei nos rostos dos participantes um pouco de letargia em entregar-se com plenitude aos folguedos. E em um dos casamentos o noivo parecia tanto apreensivo, demais até. A parceira tinha a face em pedra, entretanto lindíssima. O ritual da junção de trapos sucumbia a momentos de tensão, como se alguém solfejasse aos participantes em cruel melodia “será que vai dar certo?”
Curiosamente as cerimônias se aproximam mais do desejado por quem se casa, as imposições matriarcais diluem-se. Nos dois recentes fui não havia padres.
Pelo visto os ritos religiosos, nos seus exageros e crueldades dos últimos 3.000 anos cansaram a atual geração hiper-esclarecida. Isto é bom.
Mas diante da nova fase da vida, ainda há temores expressos.
Com padres ou sem.
Todavia este não-observador aqui arrisca um comentário: digo sempre, lembrando o sogro (mas não é dele a parábola, nem citava, mas deixo como sendo, coisa de antão, preciosa...), que os casamentos modernos remetem a comparativos estranhos: feito leite em caixinha.
Como? Sim, leite longa-vida, pois se aberto, em ambiente normal, estraga logo. Se permanecer fechado, pois é, aí há o prazo de validade...
Talvez por isso os rostos apreensivos...