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Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Frases feitas e lugares comuns

A patroa disse que o homem telefonou, se eu não fosse ia pegar mal. E também estava eu curioso, queria conhecer a figura, mesmo que em relance supersônico, acontece em eventos como aquele.

Seguimos ao local, frio do cão. Na rua mais famosa da cidade, em sua melhor livraria; da rua e da cidade. Lotado o recinto, filas para comprar livros. Pequena ilusão, porém, uma pane na informática deixava transparecer grandes negócios... não era o exagero apresentado. Com os livros do homem comprados, um para “consumo”, outro para a filha, na intoleravelmente distante Índia, fã do homem e seus escritos. Lá estávamos aguardando em linha para a dedicatória de praxe, a conhecer a com quem só havia contracenado no palco eletrônico deste bilogue, que tanta alegria me dá.

Chegada a vez, meio tonto dos vinhos brancos derramados na goela (e milagrosamente gelados, em copos de vidro, ao contrário da normalidade nesses happenings) observo o cara, escritor, jornalista, dos bons. Dos muito bons.

Dir-se-ia, fino trato. Os dedos, com muitos anéis (lembrei de uma frase feita : vão-se os anéis, ficam os dedos..., nunca entendi direito), uma canetona supimpa a assinar e dedicar, livro após livro, às figuras presentes e ausentes. Com uma inovação, com certeza inédita: portentoso e imenso carimbo, a simplificar a dedicatória, em alternativas de caixinhas a assinalar, com data e firma... Curioso. Prático.

Mas lembrou-me repartições de anteontem, coisa de prefeitura, escola, milicos. Pensei comigo: só falta o selinho cor de abóbora, lembram dele? Até documento de cobrança recebia os ditos, duplicata só valia com selinhos no verso. Minha certidão de nascimento parece uma horta colorida, de tantos.

Enfim os cumprimentos, o homem afável, divertido, irônico, brincalhão. Com estilo. Assinou a dedicatória, despedimo-nos dele e seu simpático filho e fomos, para a poluicéia gelada.

Paramos em um boteco, de nome Brasil, tomamos chopes e comemos bobagens, de bolinhos de pele de bacalhau (dizem só usam a pele) e pastéis de caranguejo. Não fazíamos há anos. Sem fumaça, saudades de botecos esfumaçados.

Quase um lugar comum, boteco esfumaçado que os tucanos fascistóides enterraram, com suas leis para tudo, multas e regras. Com largo apoio, corja de seguidores.

Mas citei lugar comum e frases feitas: o livro lançado é sobre isto, do grande Humberto Werneck.

Um dicionário distinto, coletânea das figuras de linguagem tão batidas, que ousou colocar em ordem. O Pai dos Burros (Arquipélago Editorial, Porto Alegre, 2009). Narra com acribia:

”No começo, sem saber exatamente por que estava guardando semelhante cacaria, eu fazia anotações em qualquer pedaço de papel, que depois enfiava num envelope, mais tarde num envelopão. O antiborboletário foi crescendo. Em mais de uma ocasião, nessas heróicas faxinas de escritório, por pouco não joguei no lixo aquilo que exatamente como lixo eu havia coletado.”

Enfim, maravilhoso apanhado em método diferente, como eu nunca havia visto. A palavra se abrindo em leque, com várias frases formadoras dos tais lugares comuns; ou frases feitas. Se me permitem, um exemplo:

Futuro:

Criança de hoje é o futuro do Brasil
Futuro brilhante
Futuro incerto
Futuro promissor
Num futuro próximo
O futuro a Deus pertence
Preparar um futuro tranqüilo
Ter um grande futuro pela frente

Excelente obra para consultas, principalmente a outros autores policiarem-se em não detonar em seus escritos a infinidade de lugares comuns e frases feitas que pululam por aí. A especificidade dos dicionários é importante, a contribuição de Werneck, além de divertida, necessidade para a melhor escrita.

Obrigatório para não incorrer no cipoal dos lugares comuns, do amigo Humberto Werneck um belo dicionário.

Comentários (clique para comentar)

- 02/09/2009 (14:09)

Lula não le estas coisas, declara abertamente que "não gosta de ler"...

Daniela Brusco - 02/09/2009 (11:09)

O Lula vai gostar