O grande economista, o prefeito e seu filho
Aqui presentinho para amiga, diligente operária de ajuste das almas, grande criatura. Como conhece os personagens, e recentemente me recontaram o caso, vai o apanhado abaixo, com os votos de muitos outros eventos a comemorar.
Por "sermos assim”, em alguns episódios narrados, percebe-se a questão humana é saborosa e divertida. Me contou um sujeito formidável, brincalhão, que, prefeito de uma cidade no interior de um estado nordestino, em épocas de João Goulart, foi ao Recife pleitear ajudas, após grande enchente ocorrida. O chefe do órgão regulava e ouvia pleitos e reclamos, era famoso economista cearense, homem de brilhos, literato na escrita.
Fez-se o pedido e dias após veio a solicitação para o prefeito seguisse ao órgão, a verificar-se o necessitado, analisar e tudo seria resolvido; no melhor espírito socialista, doutrina a ambos era luz condutora.
Dito e feito, o prefeito com seu carro particular apesar da missão oficial, motorista e um filho pequeno seguiram ao encontro. Imaginem-se as estradas naquele começo de anos sessenta. Centenas de sacolejos após, chegaram à capital pernambucana e, instalados em hotelzinho humilde, (o homem gostava de mostrar em serviço público era possível o auto da modéstia), aguardaram a recepção e reunião para o dia seguinte.
Banho tomado, café-da-manhã digerido, seguiu com o motorista e o filho, menino de seus 6 ou 7 anos, ao portentoso prédio do instituto de governo, de nome quilométrico (outra e infrutífera tentavia de acabar com a seca do Nordeste). A macaquear-se coisas de Roosevelt, assim o fez com o New Deal e as obras no Vale do Tennesee.
Chegados à recepção, foi informado poderia subir ao último andar, lá a secretária do famoso economista e chefe da dita superintendência o aguardava, horário acertado havia. Elevador e finalmente, um pouco ansioso com o formalismo e a importância do personagem, o prefeito bate à porta da elegante sala.
Nenhuma resposta.
Bate novamente e vagarosamente testa a maçaneta, que cede. Cuidadosamente observa pela fresta e constata a ante-sala vazia. A secretária não está.
Resolve esperar, puxa o filho para dentro, este com os olhos arregalados observando a pompa do ambiente, as pesadas escrivaninhas e um luxo raro à época, o zunido do aparelho de ar refrigerado. Sentam-se e aguardam.
O prefeito após os minutos de quartus academicus e nada de surgir ao menos a secretária, temeroso não teriam anunciado a sua subida à sala do capo, com o filho à mão, segue até outra porta, maior e mais pesada, talvez uma maciça caviúna e, corajoso, abre.
E tenta imediatamente cobrir os olhos do filhinho, pai precavido e precauteloso era. Porém este, ligeiro, menino serelepe, vê a cena como um primeiro contato com o às vezes menos discreto mundo dos adultos.
De calças arriadas, gravata folgada, bufando feito um garanhão em transe, o famoso economista empurrava a retaguarda da também extasiada secretária, por cima dos papéis oficiais, canetas, telefones e, em tal ritmo, nem perceberam o prefeito e seu menino, este moleque que desatou a rir.
Assim também o prefeito, porém ligeiro e discreto, fechou a portona e voltou à ante-sala. Onde aguardaram o fim dos relinchos do fogoso par.
Surgiu a moçoila com as bochechas rosadas e, séria, anunciou o “doutor” iria recebê-los.
Pelo soube, pouco se conseguiu e após o golpe de 64, o camarada amante de secretárias bonitas exilou-se na França, retornando apenas em 84, anistiado. Virou ícone da esquerda economista e foi um dos raríssimos brasileiros indicados ao Nobel.
E, claro, renomado apreciador das mulheres. São assim.