Foto do Hermógenes

Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Trabalhar na Índia

Por Luis Barbieri

A definição de trabalho e como cada indivíduo se relaciona com este campo de nossas vidas sempre me intrigou. Criado numa família de imigrantes ligados ao comércio, foi caminhando pelos bazares indianos que entendi talvez um pouco da raiz deste fascínio da minha família paterna pelo trabalho constante.

As lojas, pequenas vendas geridas de forma familiar, funcionam todos os dias da semana deste o início da manhã até tarde da noite. Nelas podemos notar que as pessoas ali sentadas, com uma alegria enorme, conversam, visitam as lojas dos vizinhos, fazem planos sobre as próximas semanas, barganham com seus compradores, discutem com seus fornecedores, comem e fumam.

Aqui na Índia esta forma de transformar o trabalho em lazer, ou o lazer em trabalho, e a mistura de tudo isso na sua motivação de viver, têm me feito pensar muito.

Mas tudo isso é porque gostaria de compartilhar com vocês algumas fotos que tirei na semana passada durante uma visita de trabalho ao sul da Índia. Estive no estado de Andhra Pradesh, uma região talvez do tamanho do estado de São Paulo com uma população de 70 milhoes de habitantes, sua capital Hyderabad foi o centro de um importante reino muçulmano e o último a ser incorporado à Índia independente, em 1947.

Durante a viagem, uma das manhãs acordei às 6 horas e tomei, após a trivial barganha de preços, um riquixá para ir visitar meu lugar preferido em todas as cidades por onde passo: o Mercado.

Ao chegar naquele Mercado tive uma gostosa sensação de estar chegando em casa, vendo todas aquelas frutas e legumes e a alegria das pessoas que ali estavam iniciando seu dia comprando ou vendendo o alimento e o sustento de suas famílias. Comecei minha caminhada de forma acanhada por entre as barracas, buscando reconhecer a variedade de alimentos e a forma como eram harmoniosamente dispostos sobre uma grande variedade de cestas, feitas a partir de diferentes fibras naturais. Uma destas belas cestas despertou meu interesse, estava presa ao fundo de uma bicicleta cheia de alimentos, fui convencer com seu dono a comprá-la, mas o mesmo informou que esta era feita por uma população que vivia fora da cidade e que só poderia me trazer um exemplar dela em três dias, quando já seria tarde demais!

O motorista do meu riquixá então disse que poderia me levar para comprar cestas direto na fonte, na fábrica em que eram produzidas no caminho de volta ao hotel. Não hesitei um minuto sequer, e lá fomos nós pela manhã do sul da Índia entrando por ruelas minúsculas ate chegarmos ao recanto dos fazedores de cestas.

Eram quatro casas, algumas cestas à mostra. Ao chegarmos o dono do estabelecimento estava sentado no chão ao lado de sua esposa, ambos tinham nas mãos palha de buriti e teciam. Ao lado deles estava uma senhora, possivelmente a avó, rodeada pelos utensílios de cozinha da família, enquanto dava banho com uma caneca num menino de cinco anos preparando-se para ir à escola.

Quando fui pedir uma cesta, o nosso fazedor me surpreendeu dizendo que faria duas versões naquela mesma hora, especialmente pra mim. Decidi esperar, e foi observando aquele homem preparando minhas futuras cestas durante quinze minutos que continuei minha reflexão sobres as possíveis formas de combinar trabalho e lazer, a vida e a família.

Acho que este é um tema muito interessante para ser pensado em todas as fases de nossas vidas.

Espero que gostem das fotos!

Os mercados e sua profusão de cores. Não deve ser simples o sistema para manter 1 bilhão e 200 milhões de habitantes em condições de sobrevivência, mas pelo visto funciona.

O artesão e seus cestos, com elaboração de design especial para o autor. A oficina é de simplicidade funcional, um primor.

A vida indiana se alegra pelos mercados. O comércio sempre foi o grande promotor da paz.

Comentários (clique para comentar)

b. picchi - 16/02/2009 (17:02)

Belo texto Luis! Abraços de Rio Claro

Luis Alvaro - 16/02/2009 (13:02)

O HOMEM (E A MULHER TAMBEM) PRIMAM PELO ENORME PODER DE ADAPTABILIDADE QUE POSSUEM.... NÃO TEM UM MONTE DE GENTE TRABALHANDO PROXIMOS DO POLO NORTE? A 60o.C ABAIXO DE ZERO E NO SAHARA A 60o.C? LUDWIG VON ALBARUS

shiva em gurgaon - 16/02/2009 (12:02)

vejam mais imagens da feira de Kakinada no blogue http://shivaemgurgaon.wordpress.com

Penha - 16/02/2009 (10:02)

concordo plenamente com o comentário anterior. Confesso, Luís, que apesar de não conhecê-lo, me senti impulsionada a lhe dizer que seu texto me comoveu profundamente. Talvez, porque valorizo muito as pessoas que sempre estão dispostas a conhecer o outro, a compreender o outro.

- 16/02/2009 (10:02)

Conhecemos as pessoas observando o que as interessa. O fascínio pelos mercados é próprio de gente que respeita e valoriza a cultura do outro, característica dos sensíveis e bons.