Entrando aos poucos na água fria...
Por Julia T. Bussius
A Índia. Nunca pensei que viria para cá. Não que eu me recusasse ou tivesse horror da ideia, pois achava que deveria ser interessante, mas estava longe de ser meu destino número um de viagem. Que dirá um lugar onde iria passar dois anos, morando, no duro. Aos poucos, porém, fui chegando aqui. Primeiro pelos olhos do marido, que veio na frente para desbravar o subcontinente que nos aguardava. Ao falar com ele, receber as fotos, ia formando aos poucos a imagem na cabeça. Quando perguntei o que ele tinha achado, logo que ele pisou aqui pela primeira vez, só me respondeu depois de um tempinho de silêncio, assim: “é… é, hum, diferente”.
Eu estava me preparando para ver algo diferente, devo admitir. Mas nada do que eu soubesse e tivesse sido prevenida de antemão chegava aos pés do que é estar aqui de fato. O barulho, constante, a sujeira espalhada por todo lado, dominando todos os cantos das ruas, dos trens, dos parques (com raras exceções de alguns oásis de limpeza), a miséria de um lado, o luxo extremo de outro – o clichê é mais do que real. A multidão de gente, os olhares invasivos dos homens nas ruas, que lhe comem com os olhos por causa da sua roupa e das suas feições ocidentais. As comidas cheias de sabores e temperos fortíssimos, a música de Bolywood que toca em todo canto, como axé na Bahia, e tem uma infinidade de video-clipes com artistas usando pouquíssimas roupas (o oposto do que vemos nas ruas) e dançando loucamente coreografias que misturam Britney Spears com dança do ventre.
Ou seja: é… é, hum, diferente. Talvez nem tanto para nós, brasileiros, pode se pensar, que também estamos acostumados a um “staff” de pessoas que trabalham nas nossas casas (aqui, uma faxineira, que vai todos os dias à sua casa, ganha em média 50 dólares por mês), que temos um trânsito caótico em São Paulo, que em muitos lugares temos que brigar pelo preço das coisas (esse é um capítulo à parte nas operações comerciais indianas – vou pedir ao meu companheiro que escreva sobre isso), que gostamos de gente e de barulho. Não, nada se compara a isso aqui. O Brasil é fichinha, é a Suécia, é outra história.
Bom, mas isso tudo era apenas New Delhi e Gurgaon – a terra devastada onde moramos (muito confortavelmente, preciso dizer). Tudo mudou quando fomos para Jaipur, no último sábado. A viagem já começa intensa: chegamos às cinco e meia da manhã na estação central de trens em Delhi, tudo escuro, poucos carros pelo caminho, mas quando nos aproximamos do prédio, vem o turbilhão. Milhares de pessoas, como se fosse meio-dia, caminhando para todo lado, mais uma centena dormindo no chão, todas cobertas, inclusive as cabeças. Nós não sabíamos o que fazer, para onde olhar, onde pisar para não tropeçar em ninguém. Um cheiro forte de mijo misturado com lixo dominava o lugar.
Fomos com nossos olhos arregalados até a plataforma de onde sairia nosso trem “express”, que parecem ser a únicas linhas que não atrasam (muito). Cinco horas para percorrer 220 km, a marcha do trem é bastante lenta. Um bando de outros turistas, estrangeiros como nós, esperava agarrado às suas malas....
Continua, aguardem..