O que ocorre?
O que ocorre comigo, em me deparando com alguns escritores nobelizados, pesco logo as obras me requerem imenso esforço, para, inclusive, chegar ao final? Nada mais frustrante abandonar livro pela metade, portanto o empenho, de tempos em tempos, é hercúleo. Porém eu insisto ( neste caso também e terminei ) e acabo indo ao final.
Diário de um ano ruim é meu primeiro J.M. Coetzee, Nobel de Literatura 2003, Editora Schwarcz (Companhia da Letras) 2008, tradução do José Rubens Siqueira. Livro-blog, onde no alto da página o autor discorre sobre Deus e o mundo, abaixo escreve como se fosse sua digitadora contratada com seu companheiro yuppie-malandro, ou ele, desejando discretamente a gostosa que é a moçoila com algum cérebro, de origem tailandesa.
Portanto o discurso formal acima, com as opiniões típicas do século XXI, abaixo a masturbação mental e no sopé das páginas o malvado marido e sua nobre pequena, a defender o velho escritor caquético.
Auto-biográfico, diria eu, pois o personagem é escritor, chama-se Sr. C, mora na Austrália, já é tantinho mais velho, etc. etc.
Bom livro?
Não sei; li, mas imaginava algo mais abrangente, mais volúvel, mais poético, mais dramático, mais imponente, mais romântico, mais prosador, mais entusiasta, mais conhecedor, mais paisagístico, mais tempestuoso, mais falso, mais cínico, menos a citar outros, menos a reclamar do onipresente estado pois inevitável, menos a falar de injustiças e assim vai.
E o que deixa o leitor desanimado: nem leva a moça para passeio, copo de vinho, uma conversa melhor, roçar de pernas. Nem dá a ela, afora carta onde o diz grande homem, no que Coetzee deveria envergonhar-se desta auto-massagem de ego, a chance de enamorar-se e ganhar o velho, com uns maus tratos à tailandesa...
Não digo é livro ruim, mas atrevo-me declarar: prêmios Nobel e Oscarizados, depois de levarem os tais, há certa “desinspiração” em quem recebeu.
São assim. The right to rest on their laurels. O direito de descansar sobre os louros... é justo.
A opinião não é solitária. De forma similar um jornal alemão diz sobre o livro:
In diesem geschlossenen System der Selbstreflexion fühlt man sich als Leser überflüssig. Es braucht uns nicht, brauchen wir es?
"Neste sistema fechado de auto-reflexão o leitor sente-se desnecessário. Não precisa de nós, precisamos dele?" (Berliner Zeitung, 17.04.2008)
Hermó - 05/09/2008 (09:09)
É interessante, o comércio com os "artigos religiosos". Martinho Lutero brigou contra isto, a condenar os atos da igreja de Roma por vender artigos "originais" , como lascas da cruz de Cristo ou de seu sudário. A garantir a ida ao reino dos céus, sem o pedágio do purgatório. "Der Taler in der Kasse klingt, die Seele in den Himmel springt" dizia ele, sarcasticamente. Algo como : "A moeda na caixinha tilintar, a alma ao reino celeste adentrar".
- 05/09/2008 (09:09)
$incretismo (sorry)
b. picchi - 05/09/2008 (09:09)
Trabalhei na livraria O GUARANI, na XII de Outubro (bairro da Lapa). O dono, fundamentalista da Renascer em Cristo (da bispa $ônia), tinha como carro chefe os da famíla Gasparetto... viva o $isncretismo religio$o !!! e fendia muito... como a bíblia
Hermó - 04/09/2008 (12:09)
Como dizia meu pai: fende para Kassetten... O livro mais vendido e menos lido na história, por curiosidade é a Bíblia. Todos têm, pouquíssimos lêem. De qualquer forma, dizem, o P. Coelho cativa quem está inspirado. 20.000.000 de leitores, nada mal.
JORGE DOS SANTOS - 04/09/2008 (09:09)
Bom gosto o teu. Paulo Coelho é lamentável, apenas uma pegadinha literária. Mas vende, né?
Hermó - 04/09/2008 (07:09)
Jorge, meu amigo, não posso opiniar. E digo, algo envergonhado, a razão. Não li nada do Paulo Coelho, embaraço terrível para mim. Me parece hoje ao lado do Sidney Sheldon, da J.K Rowland (a do Harry Potter) quem mais vende livros (e portanto mais leitores têm). Por sinal também não li nada destes. Não sei a razão. Inveja, talvez? Lembro ter comprado um P.Coelho e folheado, mas a mística "não bateu". É como maconha, a primeira vez que fumei odiei (mais pela nojenta babação da pituca do que pelo efeito). A segunda e última vez, numa roda de jovens, já eu velhão, me perguntaram "E, aí? Bateu?". Nada. Sem graça. Um cheiro horrível de grama velha queimando. Prefiro charutos, cigarros e uísque. Assim como prefiro ler Hemingway, Conrad, Karl May, Camus, Guimarães e os poemas da minha filha.
JORGE DOS SANTOS - 04/09/2008 (00:09)
...imaginava algo mais abrangente, mais volúvel, mais poético, mais dramático, mais imponente, mais romântico, mais prosador, mais entusiasta, mais conhecedor, mais paisagístico, mais tempestuoso, mais falso, mais cínico, menos a citar outros, menos a reclamar do onipresente estado pois inevitável, menos a falar de injustiças e assim vai... A MIM QUASE PARECE QUE ESCREVESTE SOBRE O PAULO COELHO.
Hermó - 02/09/2008 (07:09)
Ceeeeeeeeeeerto! Obrigado, curiosamente o corretor não assinalou este, revejo aqui.
Daniel - 01/09/2008 (21:09)
"algo mais abragente"
seria abrangente?
- 01/09/2008 (15:09)
Cornelia Rau é uma alemã radicada na Austrália, que presa em 2004 por ser "imigrante ilegal" (estava caroneando pelo país), permanece assim por meio-ano. Esquizofrênica, sem os medicamentos, assume na prisão uma série de desejados personagens, não permitindo a quem seja da dita área burocrática, de psicólogos prisionais e psiquiatras forenses à adidos consulares descobrirem quem é. De certa forma mostra a total impossibilidade de alguém identificar o outro, no caso da recusa ou, como este, no evento da doença mental. Através de uma reportagem, a moça é identificado pelos pais, estes que já haviam colocado junto aos policiais um aviso de desaparecimento e então libertada. Mostra a intolerância e incomunicabilidade das autoridades, a imperícia dos psiquiatras de fórum, enfim a total inabilidade do estado em questões que fogem a que rotulam normal. Recebeu agora em 2008 uma indenização de milhões de dólares, pois seu advogado resolveu processar o estado australiano, visto ela ser residente no país desde os 4 meses de idade... com documentação completa de imigração.