Sonata de Outono, para pensar
Charlotte Andergast, uma bem sucedida pianista de concerto, acaba de perder Leonardo, o homem com quem vivia há muitos anos. A sua morte a abate, deixando-a num estado de solidão e perturbação. A filha Eva, que está casada faz alguns anos com certo clérigo, e vive numa pequena cidade da Noruega, pede à mãe para a visitar.
Durante alguns dias, as duas mulheres confrontam-se. Umas vezes sentem repulsa pela outra, outras vezes procuram as suas mútuas companhias. Porém o encontro será crucial para o futuro de ambas. O que está em causa na sua relação é obrigatoriamente o amor: sua presença e a ausência do amor, o desejo do amor, as mentiras do amor, o amor deformado; e o amor como a nossa única imaginada esperança para sobreviver.
Sofria eu de terrível tédio, quando jovem, ao assistir algo de Ingmar Bergman, o qual se foi, se não me falha a memória, ano passado. Eram os filmes “cabeça”, só os “descolados” entendiam. Nós éramos padrão, classe média desinteressada, geração revista Veja.
Nosso troço era boteco, papo sobre as “minas” e coisas da época, como carros lançados, acampamentos em praias distantes e completar o ano sem muitas segundas-épocas.
Entretanto tomei coragem e disse a mim: o cara não deve ser tão monótono a ponto de eu, maduro, não ter um pouco de paciência e ir do começo ao fim. Aluguei Sonata de Outono (1978), mais pela adorável Ingrid Bergman que pelo cineasta famoso.
E lá foi o filme.
Derrubou-me, la Bergman está divina, pelos 60 anos eu imagino, à época. Uma atriz completa, seus monólogos na angústia da mãe relapsa, absolutamente perfeitos. E Liv Ullman, como a filha recalcada, é destas atrizes incorpora o papel, a ponto de imaginar-se não passou por questão similar.
A cena de mãe e filha ao piano, onde a menor habilidade da jovem com o instrumento é audível, e a mãe, mestra, a corrigir sem o dizer, e a filha a odiar, quando tocada a peça pela mãe, reputo inigualável.
Bergman atinge a interação da solidão com os seres até na maravilhosa cena do fiorde norueguês, e sua placidez de verão, em formidável paisagem. Não há quem deixe de suspirar, como: que lugar lindo, que dificuldades relacionais temos nós humanos!.
Porém os embates entre mãe e filha, ambas a decifrarem o motivo de seus antagonismos, mulheres altivas e inteligentes, faz da película, diria, bom filme, dos melhores.
Aprendi com o tempo, até a gostar de Bergman... Somos assim.