Foto do Hermógenes

Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Os aventureiros se acomodam

Vejo aqui anúncio de revista de clube, destes da “crasse” média paulistana, como escrachadamente se refere a maioria (os quais não são sócios, óbvio), donde Amyr Khan Klink apresenta-se em palestra; e como guia de excursão à Antártida, nesses quebra-gelos ou navios polares russos; ou noruegueses. Deve ser homem da minha idade, pelos 50.

Aparentemente cansou da solidão no mar, há muitas contas a pagar e os projetos náutico-aventureiros, mundo afora, já não despertam tanta curiosidade. Estamos mais para auto-ajuda, culinária, bossa-nova e, valha-me Deus, ler sobre cachorros e sua psicologia.

É verdade: a história imbecil do tal Marley, cão gringo, faz sucesso; estrondoso. Daí o pobre Klink, agora, vai de palestras sobre solidão em lugares inóspitos ou explicando que o gelo antártico se move em milímetros por ano, para turistas; e os baleeiros americanos foram os de fato desbravaram a região, etc., etc., pausa para o almoço, senhoras e senhores.

Seus barcos, vejo em Parati, na marina próxima onde guardo meu bote, jamais se movem a navegar, com aquelas estrias escuras pelo costado, de naus paradas faz muito tempo. A época das aventuras terminou?

Penso sim: quem sabe o nome dos tripulantes do último ônibus espacial? De quem está na estação espacial? De quem deu a volta em balão de ar quente no planeta? De avião em non-stop sem reabastecer? Do brasileiro deu a volta ao mundo, em solitário, por três vezes num pequeno barco à vela?

O interesse diminui, o romantismo, a aventura; associadas do séculos dezenove e vinte, e seus escritores Joseph Conrad, Herman Melville; seus aventureiros Lawrence, Robert Falcon Scott, Roald Amundsen, Nobile e Nansen, bem, acabou.

Pessoalmente conheci um.

Horst Althaus, mistura entre aventureiro e semi-bandido. Torneiro frustrado na Alemanha, abriu instaladora de placas de forro. Fez dinheiro, tornou-se paraquedista, piloto e motociclista. Um dia abandonou os negócios, deu volta ao mundo, foi para os EUA, arrumou viúva, fê-la comprar bimotor com as suadas economias, divorciou-se, “aceitou” o avião como reparação e saiu a voar pela América Latina, enganando a muitos, inclusive a mim.

Conhecia-o dos EUA onde fiz brevê em escola possuía o safado temporariamente por lá, o malandro-aventureiro.

Aportou por aqui em 1982, já divorciado. Pediu grana emprestada, gastou. Pagou com trabalhos arrumamos para ele, motorista de empilhadeira. Porém, inquieto, certo dia sumiu para o Paraguai, disse ia vender o avião. Era golpe de seguro, pousou propositadamente no Rio Iguaçu, molhou tudo, perda total. Confessou-me depois. Pediu mais dinheiro, voltou aos EUA. Nunca me pagou.

Descobri, ano passado , na Internet. Flieger-Horst: "Escritor de aventuras!”.

Telefonei, curioso, parecia ser homem de algum sucesso pela Alemanha. Disse-me que mais ou menos, na verdade era motorista de taxi, para pagar as contas...

Não há mais aventureiros galantes, apenas palestrantes e motoristas de taxi.

Somos assim.

Palestras e entrevistas, o glamour da aventura crua e dura diminui um tanto.

Guia turístico para endinheirados gringos na Antártida. Bem, as contas têm que ser pagas...(para ampliar a foto e anúncio, clique sobre a própria. Quem sabe não faz a viagem?)

Horst A., de posse do dinheiro do divórcio, compra um Beech, vai da Alemanha até os EUA. Pensa em vender, mas paga-se pouco. Tenta na América Latina e por aqui fica, por conta do seguro e suspeito pouso no Rio Iguaçú... (Foto em Reiquiavique.)

Em 1986, última parada. Claro, no Brasil. Sem grana e sem meios, outro avião perdido, volta à Alemanha. Hoje é motorista de taxi.

Comentários (clique para comentar)

Hermó - 06/08/2008 (11:08)

No momento estou arrumando a minha salvação na vela: genoa e enrolador, que pifaram na última inspeção da seguradora (são tão delicados...). Assim que reinstalado vou dar uma navegada até Angra, ai ajustamos e nos vemos. Abração! Semana que vem, quarta, tem chope da turma. Venha!

Claudio Kunze - 06/08/2008 (10:08)

Voltando ao Amyr Kling, a remada da Africa ao Brasil, foi uma aventura e das boas, mesmo com o fator sorte que o ajudou, tiro o chapeu a ele, dai pra frente os veleiros que acho pessoalmente umas patas chocas, foi tudo uma questao de planejamento com muita $$$ envolvida.... De ca abracos ao meu amigo Hermo, precisamos nos ver.....

C - 06/08/2008 (10:08)

Thomas - 04/08/2008 (08:08)

O golpe do seguro prescreveu, já pode ele mostrar as asas de novo... O contato foi dele, parece que achou o site www.mavi.com.br e escreveu. A idéia do taxi é boa. Uma corrida de Frankfurt a Oslo... pagando em guaranis... No livro que escreveu, ficou por aqui até 1989 (!) 7 anos. Desconfio que seus vôos latino-americanos eram para transportar ilicitudes... Em certo ponto do livro, diz que é difícil saber a diferença entre o traficante e o policial de narcóticos...

ishida - 03/08/2008 (20:08)

Como conseguiu contato com este aventureiro novamente??? Lembro-me dessa figura! Deveria contratar uma corrida de taxi pela Europa toda e dar-lhe um "cano" recíproco, para que sinta na pele a sacanagem que aprontou mundo afora...

denise mendonça teixeira - 02/08/2008 (14:08)

Aventureiro é um espirito, independe do que vai ser desbravado....