Rio de Janeiro
Após 47 anos e com uma excelente oportunidade, eu Hermógenes resolvi reviver momentos da boa infância. Viagem ao Rio.
Não pelos caminhos convencionais: Ponte Aérea, chegada, hotel ou, quem sabe, até a volta no mesmo dia como tantas vezes fiz: a “serviço”. Sem paulistanices apressadas. A ida seria de ônibus, como nos tempos de moleque, a apreciar pela janela o lento passar da paisagem.
Guarulhos, São José dos Campos, Taubaté, Guaratinguetá, Aparecida, Lorena, Rezende...
O pai, funcionário de multinacional, seguia de avião a resolver seus troços; nós os pequenos e a mãe, na contenção de despesas íamos de Cometa ou Expresso Brasileiro, não lembro mais. Com parada no Clube dos 500, imagino não mais existe. Pelo menos não o vi.
Fui de outro Expresso qualquer, conforto formidável. O triplo do espaço das jaulas voadoras. Sem as veadagens do embarque regulado pelas ANACS da vida, que a cada passo pedem sua identidade, controlam sua bagagem, etc. E tudo só em originais, pois carimbo e selo de cartório não vale para autenticar documento nenhum em viagens aéreas. E, óbvio, já dispensar o incauto garantindo o "overbooking", pois quantos mais rejeitados por este esdrúxulo motivo "oficial", dispensa-se o bôbo que acredita em documento autenticado, sem embarcá-lo; tanto mais lucros, vendendo lugares inexistentes.
O medo de ataque terrorista, e a prevenção, só vale para aviões. Explodir busão de passageiros pagando 63 paus até o Rio não dá notícia. Avião, com 170, vale pouco mais, cada um pagando seus 300...
Coisas do Brasil; não mudamos.
A fila de embarque do ônibus é mansa, rápida. Ninguém empurra, não se discrimina ninguém. Lá dentro agradável arzinho frio, a combater se necessário com a manta e travesseiro dados a todos, sem implorar-se às ainda frescas aeromoças. Bom filme apresentado, nacional, em som bem baixo com legendas, para não atrapalhar o sono de quem não deseja ver. Nos aviões em vôos nacionais não os há mais. Pode-se rezar para pousar inteiro, como alternativa.
Lanche bom, suficiente. Parada de 30 minutos em postões que vendem de “peido a pedra-de-isqueiro”. Seguindo ao Rio pela lisa Dutra, com algum receio na chegada. A tal Baixada Fluminense e suas fábricas abandonadas; imensas aglomerações com casebres de bloco, figuras um tanto menos distintas circulando entre elas; desperta certo receio.
Em uma das paradas naquela região, onde descem alguns, dois circunstantes, bêbados pelo visto, me apontaram indicador e polegar esticado, movendo a boca em puft-puft. Se fosse o que chamam de ferro, ou berro verdadeiro, seria mais um na lista dos muitos que apagam por lá. Mas o problema é nacional, por aqui também há bairros bem assustadores.
Na chegada à rodoviária carioca o desembarque ligeiro e táxi, ao som de cantos evangélicos soprando em meus ouvidos Deus e Jesus estarem próximos, me levou a 100 por hora, inspirado na "Formula 1", até o hotel. Ufa! O único susto da viagem à cidade maravilhosa.
Continua a mais bonita. Apesar de toda pixada e imunda em seu contorno miserável, além dos morros estarem mais apinhados de construções sólidas (seriam para segurar os tiros?) a orla é bem mantida; para a turistada. Porém a vista do quarto para o tal Morro do Vidigal, onde dizem até o Bope tem suas ressalvas de subir, nos faz lembrar segurança pública no Brasil nunca ser, nem será, prioridade de governo.
No hotel, acho, os únicos “nativos” éramos nós. Desde soldados americanos em férias (não me perguntem; é óbvio o que vêm fazer por cá), turistas espanhóis, russos, alemães, japoneses e argentinos. Encantados com a vista e a cortesia carioca. Boa característica. Simpáticos, brincalhões, tolerantes, charmosas suas mulheres lindas. A diferenciar dos demais brasileiros, salvo dos baianos.
À noite, jantamos em lugar destes não mais existentes por cá, o gostoso restaurante brasileiro. Barato, limpo e com comida excelente, bem servida. “Degrau” é o nome do local, no Leblon. Perguntei ao amigo Gorski a nos acompanhar, paulista como eu, mas amante inveterado do Rio e principalmente do Leblon, do que vivia a cidade.
Pois desindustrializada, sem os grandes escritórios das estatais agora privatizadas, não seria o turismo a suprir tudo.
“Aposentadorias”, disse ele. E com razão, no restaurante, a maioria presente eram casais de alguma idade, com cara, se isto existe, de aposentados oriundos das instituições do governo.
Sabemos ganham bem. Muito bem...