Z.
Curiosamente seu desprezo pelos humanos acumulava-se em poucos lamentos de incompreensão. Em crescendo formidável, a não desejar mais tê-los à volta. Ultra-antropofóbico, irritável com a mera presença dos bípedes falantes.
Não ia mais a cinemas pelo ódio a quem ao lado sentado comesse pipocas fedorentas, regurgitando sonoramente. Ou trafegasse em aviões, disputando apoios de braço com criaturas titulava folgadões. Se armado, mataria, se furassem filas em bancos, onde buscava a magra aposentadoria, com descontos eternos.
Revia estranho filme gringo, Dia de Fúria, onde cidadão comum estourava de ódio e incompreensão; partia para aquilo popularmente denominam ignorância. Achava certo o início, bobo o final com a lição moralista devermos ser bons, obedientes e tolerantes.
Pensou em fazer-se ao mar, para sempre. Longe das pessoas. Em veleirinho, lia muito sobre isto.
Não tinha os meios e o mar era distante; e desconhecido para ele, homem urbano. A odiar outros urbanos. Cada vez mais.
Isolava-se, tanto e tanto.
Comunicava-se escrevendo, raramente por telefone. Relia a biografia de Howard Hughes, o milionário antropofóbico passara anos sem contato com os seres chatos, que cobravam, desejavam proximidade, favores, calores e alentos.
E relia, e relia.
Encontraram-no semana passada; foi a empregada doméstica, de anos, aquela Z. tolerava pois não falava, não se aproximava, fazia o certo. Caído no vestíbulo, por sobre o computador.
Sua última frase, ainda no ligado monitor, fosforecendo miúda:
- "Me deixem em paz."