O homem na cozinha
Por Luiza. T. Bussius, de Ipiaú, Bahia.
Meu pai sempre nos convocou à cozinha. Talvez por isso, hoje, que vivo longe, sempre lembro dele ao pegar nas panelas.
Devia ter uns 8, 9 anos quando eu o ajudava a virar os potinhos de risoto nos pratos que ele preparava aos amigos nos jantares em casa. Era um encantamento ver aquela mini montanha erguida no prato. Tipo fazer bolinho na areia com meu pequeno.
Hoje ele não faz mais isso. Dava muito trabalho. Prefere servir grandes porções em tigelas e pirex. Me dou conta como lhe dá alegria alimentar as pessoas.
Faz as compras, cozinha, sua muito no processo, coloca uma bela mesa com pratos, talheres, guardanapos, galheteiro e aquelas palhinhas para não queimar a toalha (que no momento não me lembro o nome). Prepara com esmero e deixa o que vai ficando pronto no microondas. Ele adora microondas.
Acredita ser uma grande invenção e de muito auxílio no cotidiano. Há quem duvide disso, dizendo dos malefícios da máquina. Eu fico na dúvida e uso pra guardar o bolo das formigas e requentar a comida do dia anterior. Facilita a dinâmica com as crianças.
Tento não pensar nas moléculas radioativas que podem ser transmitidas aos alimentos. Sigo em frente. Uma panela a menos para lavar.
Na época da escola, eu já adolescente, ele me mandava lanches reforçados de sanduíches com muitas camadas de frios. Às vezes até mesmo umas amigas recebiam. Hoje quando preparo algo que fica decente, saboroso, penso nele e em compartilhar.
Comecei a fazer saladas de repolho cru com maçã e maionese e é como se ele estivesse à mesa conosco e contasse de alguma receita bem prática que sua mãe alemã preparava. Ele sempre conta como ela simplesmente deixou de cozinhar quando ele fez 12 ou 14 anos. Não teve jeito, a cozinha precisou ser encarada.
Ao cortar o sanduíche para meus filhos na diagonal separando as duas metades em triângulo vem também sua generosidade alimentar na minha cabeça.
Outro dia fiz polenta e me orgulhei do resultado. Ele é o primeiro que eu penso. Cozinha afetiva dizem.
Quando nos reunimos ele se orgulha de preparar um simples copo de leite com achocolatado para meu filho mais velho, carregando no doce as muitas colheradas. Por vezes acrescenta uma de leite em pó para dar um toque cremoso. O magrelo aprecia e fica feliz. Eu penso no seu quase desprezo pela alimentação saudável que tanto valorizo, mas também fico alimentada pelo gesto carinhoso com seu neto.